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Uma dupla otimista

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Por Redação
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Se otimismo oficial derrubar inflação, os índices de preços convergirão para a meta de 4,5%, até o fim de 2012 ou, na pior hipótese, no começo do ano seguinte. O pior já passou e as pressões inflacionárias serão bem mais fracas nos próximos meses, proclamam num harmonioso dueto o ministro da Fazenda, Guido Mantega, e o presidente do Banco Central (BC), Alexandre Tombini. A alegre disposição do ministro foi manifestada no relatório bimestral Economia Brasileira em Perspectiva, divulgado na segunda-feira, e na palestra de ontem a investidores estrangeiros, em Londres. Tombini fez sua parte em depoimento perante a Comissão de Assuntos Econômicos do Senado, também ontem.Os últimos números da inflação parecem justificar a confiança da dupla. Em São Paulo, os preços ao consumidor subiram 0,01% em junho, segundo a Fipe/USP. Em maio, haviam subido 0,31%, já em desaceleração. Os preços ao produtor coletados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística diminuíram 0,55% em maio, reforçando a expectativa de menores pressões sobre o varejo nos meses seguintes. Mas o futuro da inflação não depende só da oferta de etanol e das cotações dos alimentos, influenciadas, há mais de um ano, principalmente pelas condições do mercado internacional. Essas condições continuam muito incertas, como reconheceu o presidente do BC, num momento de cautela. Mas é preciso também levar em conta a demanda interna, ainda bastante forte para pressionar os preços dos serviços e para sustentar um vigoroso movimento de importações. Ao cuidar desse ponto, o presidente do BC mostrou certa moderação. A demanda interna passou a crescer mais lentamente do que em 2010 e nos primeiros meses de 2011 e isso aponta para menores tensões inflacionárias. Mas a demanda ainda aumenta "a uma taxa robusta" e o uso da capacidade industrial, embora estabilizado, continua alto. No relatório bimestral da Fazenda, a demanda interna perdeu impulso, mas crescerá o suficiente para garantir uma expansão econômica de 4,5% neste ano, de 5% em 2012 e de 5,5% em cada um dos dois anos seguintes. Falta saber se esse ritmo será compatível com a inflação projetada para este ano e para o próximo. O otimismo da dupla em relação às condições do mercado interno é discutível. Ambos concordam em alguns pontos muito importantes para qualquer exame do cenário: a política do BC e as barreiras ao ingresso de capitais externos têm moderado a expansão do crédito, os consumidores estão menos otimistas e o ajuste das contas públicas será suficiente para completar as medidas necessárias. A arrumação das contas públicas foi apresentada com destaque no relatório. Em seu depoimento, o presidente do BC afirmou ser "muito boa" a perspectiva de alcance da meta fiscal fixada para este ano. Há alguma verdade em todas essas afirmações, mas é preciso recebê-las com muita cautela. A política monetária pode ter resultado em alguma contenção do crédito, mas o volume de empréstimos tem continuado a crescer com vigor, segundo os dados do próprio BC. Em maio, a carteira de empréstimos a pessoas físicas com recursos livres aumentou 1,7%. Os empréstimos a pessoas jurídicas cresceram 1,4%. Consideradas todas as operações, com recursos livres e dirigidos, o saldo dos financiamentos expandiu-se 1,6% no mês e 20,4% em 12 meses. Além disso, a renda dos trabalhadores tem continuado a crescer, como indicam os levantamentos mensais do IBGE. Essa é uma boa notícia, mas é preciso considerá-la quando se fala sobre a evolução da demanda. Também discutível é a gestão das finanças públicas. O governo tem conseguido um bom resultado em relação à meta fiscal. Mas isso tem sido possível principalmente por causa da elevação da receita e não da contenção dos gastos. De janeiro a maio, a receita do governo central foi 17,4% maior que a de um ano antes, em termos nominais. O PIB nominal foi 12,3% maior que dos primeiros cinco meses de 2010. Houve, portanto, mais um aumento da carga tributária e não da disciplina fiscal.