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União para derrotar a dengue

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Por Redação
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Nem a certeza de que, mudando a estação, os piores efeitos malignos da dengue passarão pode nos deixar esquecer que urge fazer já algo mais eficaz para evitar que no próximo verão, seja seco ou chuvoso, a situação venha de novo a piorar. Pois os números registrados neste momento são desalentadores. Até 18 de abril foram notificados, de acordo com o boletim epidemiológico mais recente do Ministério da Saúde, 745,9 mil registros de suspeita da doença, um aumento de 243% em relação ao mesmo período no ano passado, com 223 mil registros.

A incidência de 367,8 registros por 100 mil habitantes ultrapassa o limiar da epidemia, que, de acordo com a Organização Mundial da Saúde, é de 300 casos por 100 mil pessoas. No Estado de São Paulo foi batido o recorde nas 15 semanas iniciais do ano de mortes atribuídas ao mal transmitido pelo Aedes aegypti: 169, o maior número desde que começou essa contagem, em 1990.

Não será fácil, contudo, reverter esses dados. Isso porque, embora seja um problema de saúde pública, este é o típico caso em que o Estado tem um obstáculo difícil de contornar para tornar efetivo o combate ao agente de transmissão da doença. É que o inseto transmissor se reproduz e é disseminado em água parada, não importa se suja ou limpa. Tudo o que é possível fazer para evitar que isso aconteça é tomar uma atitude corriqueira e muito simples: evitar o empoçamento de água em recipientes descobertos. Ou seja: tampar cisternas, vasos e quaisquer outros locais em que o mosquito possa crescer e se multiplicar.

Tampar vasilhas com água ou enxugar pisos molhados é o que os cidadãos têm a fazer para evitar o alastramento de uma doença que produz muitos incômodos e até mesmo a morte, tal como tem acontecido ultimamente.

Os meios de comunicação têm tocado o alarme de forma insistente. As equipes de vigilantes sanitários têm, segundo o governador tucano, Geraldo Alckmin, e os prefeitos paulistas, inclusive o da capital, Fernando Haddad, aumentado e redobrado o trabalho. Mas é impossível que, por mais numerosos que eles sejam, tais servidores possam substituir a missão comezinha que cabe a cada cidadão no recinto inviolável de seu lar. Campanhas educativas têm se mostrado incapazes de deter o avanço da incidência do mal.

Por incrível que pareça, a única esperança de que haja uma reversão dessa curva é exatamente o fato de ela atingir cada vez mais pessoas do que antes. Neste sentido, o caso do borracheiro Cléber Elias Pereira, que mora no Jardim Novo Mundo, em Votorantim, no interior paulista, dá um exemplo de como a consciência da necessidade de prevenção pode surgir pelo contato com a doença. “Em casa, só o cachorro e o passarinho não pegaram dengue”, disse ele ao Estado. Pereira, o sogro, a mulher, os dois filhos e a mãe dele foram contaminados. Três moradores da casa vizinha também. “O pior é que o foco do mosquito estava na minha borracharia, na água de lavar pneus”, contou ele. A causa e a extensão da contaminação, neste exemplo, são óbvias: recipientes abertos são viveiros favoritos do inseto. E vizinhos, mesmo tomando o cuidado de tampar os próprios vasilhames, podem ser vitimados pela incúria de quem ao lado não cuida bem.

Os números exorbitantes de vítimas da epidemia constatada deveriam também incentivar as autoridades sanitárias de União, Estados e municípios a esquecer desavenças partidárias e a organizar o atendimento às vítimas do desleixo próprio ou alheio. De costas um para o outro, pensando apenas em votos nas próximas eleições, governantes dos três níveis fazem alarde das próprias iniciativas para identificar focos de mosquitos e atender pacientes contaminados, sem prestar atenção na única possibilidade de dar alguma efetividade ao combate da doença, levando em conta as proporções que a contaminação atingiu.

A guerra ao Aedes aegypti só será vencida pelo cidadão e pelas autoridades públicas se todos agirem pelo bem comum, com zelo doméstico e espírito público.