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Venceu a bancada do Refis

Os sonegadores e maus pagadores de impostos ganharam mais um custoso presente

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Por Redação
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Os sonegadores e maus pagadores de impostos ganharam mais um custoso presente, com a sanção do novo programa de parcelamento de dívidas tributárias pelo presidente Michel Temer. Quatro vetos limitaram os danos ao Tesouro, mas grandes aberrações introduzidas no texto enviado pelo Executivo ao Congresso foram mantidas. A renegociação, lançada por meio de Medida Provisória (MP), deveria proporcionar ao Tesouro uma receita adicional de cerca de R$ 13 bilhões, neste ano, segundo os cálculos da equipe econômica. Esse dinheiro corresponderia às primeiras parcelas do novo esquema de refinanciamento de dívidas fiscais. Com isso, o governo teria um pouco mais de facilidade para fechar as contas do ano dentro do limite fixado em lei, um déficit primário de R$ 159 bilhões. Mas o plano da equipe liderada pelo ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, foi desmontado no Congresso, onde parlamentares vinculados a interesses de grupos devedores do Fisco deformaram a proposta.

Enquanto o assunto era discutido no Congresso, empresas podiam inscrever-se no programa de refinanciamento. Essa possibilidade era garantida pela vigência de uma MP. Até setembro, o ingresso de empresas no esquema desenhado pelo Executivo proporcionou uma receita de cerca de R$ 10,5 bilhões, segundo informação divulgada pelas autoridades na semana passada. Essas empresas poderão, no entanto, migrar para as condições estabelecidas no texto finalmente aprovado pelos congressistas e sancionado pelo presidente da República.

Com essa migração, a receita proporcionada pelo novo Refis, neste ano, deverá ficar na faixa de R$ 6 bilhões a R$ 7 bilhões, de acordo com estimativa de fontes da equipe econômica. Se o cálculo se confirmar, a perda será pouco maior ou pouco menor que 50% da arrecadação planejada pelo grupo encarregado, no Executivo, de conduzir o ajuste das contas e restabelecer a saúde financeira do governo central. Esse grupo, segundo se informou na terça-feira, havia recomendado ao presidente vetos mais amplos ao texto aprovado no Congresso. Mas prevaleceu a avaliação dos conselheiros políticos.

A votação da segunda denúncia contra o presidente, formulada pelo ainda procurador-geral da República Rodrigo Janot, estava programada para ser votada na Câmara dos Deputados na quarta-feira. Na véspera, deputados da chamada bancada do Refis pressionaram o presidente para sancionar o texto aprovado. O prazo para a sanção terminaria no fim do mês, depois, portanto, da votação da denúncia, mas a bancada se mobilizou para cobrar uma ação imediata do presidente.

Ele cedeu e limitou os vetos a uns poucos pontos, como a adesão das empresas do Simples ao programa, considerada inconstitucional. Nenhum dos vetos atingiu a maior parte das enormes concessões aos devedores. Para uma das modalidades de pagamento os deputados aprovaram a redução de 90% dos juros de mora e de 70% das multas. Para outra forma de parcelamento o corte dos juros ficou em 80% e o das multas em 50%. A lista de presentes aos sonegadores vai muito além desses itens e foi exposta várias vezes pelos meios de comunicação.

A explicação continua tão simples quanto no primeiro dia: ao deformar a proposta do governo, convertendo-a numa aberração, os parlamentares mais uma vez trataram de legislar em benefício próprio e de sua clientela, à custa de milhões de contribuintes corretos e de cidadãos dependentes da ação do Estado. O artífice principal da deformação foi o deputado Newton Cardoso Jr. (PMDB-MG), mas a bancada do Refis tem mais de 50 deputados. Além disso, a aberração foi aprovada facilmente pela maioria dos parlamentares.

Ao atender aos interesses da bancada do Refis, o presidente complicou a tarefa, já muito difícil, de sua equipe econômica, tornando um pouco mais difícil o alcance da meta fiscal fixada para o ano. Além disso, o episódio dá mais um estímulo a quem quiser cobrar pelo apoio a medidas essenciais para o País, como a reforma da Previdência. O maior balcão de Brasília é aquele no qual se negociam interesses nacionais.