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Vermelhão nas contas externas

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Por Redação
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Em mais uma notável demonstração de otimismo, os economistas do Banco Central (BC) mantiveram a projeção de US$ 3 bilhões de superávit comercial neste ano, com US$ 240 bilhões de exportações de bens e importações de US$ 237 bilhões. Esses números foram divulgados na segunda-feira, juntamente com as contas externas atualizadas até outubro. Na sexta-feira, o próprio BC havia coletado uma estimativa muito menos entusiasmante em sua pesquisa Focus, conduzida semanalmente no mercado financeiro. A mediana das previsões do pessoal do mercado ficou em modestos US$ 100 milhões. Quatro semanas antes ainda estava em US$ 2,1 bilhões. Mas até a nova previsão, embora muito modesta, pode ser, nesta altura, irrealista. As últimas informações oficiais sobre o comércio exterior, publicadas também na segunda-feira, mostram um saldo fortemente marcado de vermelho. O Brasil teve um déficit comercial de US$ 4,12 bilhões, neste ano, até o dia 23 de novembro, segundo o Ministério do Desenvolvimento. As exportações acumuladas nesse período, de US$ 203,7 bilhões, foram 5,3% menores, em valor, que as de um ano antes. As importações, de US$ 211,37 bilhões, foram 3,5% inferiores às de igual período de 2013. As comparações, nos dois casos, são baseadas nas médias por dia útil. No ano passado, até a terceira semana de novembro, o saldo era um déficit de US$ 284 milhões.A conta foi fechada no fim do ano com um superávit de US$ 2,39 bilhões, graças, principalmente, à venda de duas plataformas de exploração de petróleo - uma no valor de US$ 1,8 bilhão, em novembro, outra por US$ 1,2 bilhão, em dezembro. As duas, como outras exportadas sob o mesmo regime de benefício fiscal, continuaram no País, mas os valores inflaram a receita comercial. Neste ano, qualquer manobra desse tipo será mais complicada. Só para equilibrar a conta, isto é, para eliminar o déficit, será preciso acumular um superávit de US$ 4,12 bilhões nas cinco semanas entre 23 de novembro e o fim de dezembro. Para alcançar o saldo projetado pelo BC, de US$ 3 bilhões, será necessário um resultado positivo, em menos de um mês e meio, de US$ 7,12 bilhões. Alguém terá de providenciar a venda fictícia de umas quatro plataformas para garantir esse resultado. Mesmo o raquítico superávit de US$ 100 milhões ainda estimado pelos economistas do setor financeiro dificilmente será obtido sem muita sorte ou sem algum expediente criativo. Desde setembro a conta do comércio exterior tem piorado. Nos dois primeiros meses desse período houve déficits de US$ 940 milhões e US$ 1,18 bilhão. Em novembro, o saldo acumulado em três semanas foi um buraco de US$ 2,25 bilhões. A piora tem resultado tanto da redução de preços de produtos básicos e semimanufaturados quanto dos problemas no comércio de manufaturados. Mas o quadro poderia ser pior. A estagnação brasileira afetou a demanda de importações. As compras de bens estrangeiros também diminuíram, embora menos que as vendas ao exterior. Misturam-se nesse quadro vários problemas. Um dos mais visíveis é o baixo poder de competição da indústria. Essa condição resulta de várias disfunções, conhecidas, na maior parte, como custo Brasil. Muito menos discutida é a excessiva dependência das vendas de produtos básicos e, portanto, da demanda chinesa de matérias-primas. Uma indústria mais dinâmica, fortalecida por mais investimentos e menos travada por impostos e outros fatores de distorção, tornaria o comércio exterior mais seguro e mais propício ao crescimento econômico. Outro tipo de problema é o financiamento das contas externas. Em 12 meses o déficit em conta corrente - o registro mais amplo das transações com o exterior - chegou a US$ 84,43 bilhões, ou 3,73% do Produto Interno Bruto (PIB) estimado para o período. O investimento direto estrangeiro, a fonte mais saudável de financiamento da conta corrente, ficou em US$ 66 bilhões. O resto foi coberto com capitais menos seguros e mais sujeitos a movimentos especulativos.