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A crise continuada da Educação

Que educadores com biografia impecável aceitarão servir a um governo como o atual

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Por Notas & Informações
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Seja qual for o nome escolhido pelo presidente Jair Bolsonaro para ser o quarto titular do Ministério da Educação (MEC), em apenas um ano e meio de governo, ele quase certamente assumirá o cargo com pouca autoridade para liderar o desafio da reforma do combalido sistema educacional brasileiro. Entre outras razões porque, dados os critérios mais políticos do que técnicos que devem prevalecer em sua escolha, ele tem tudo para ser, mesmo que tenha a vontade de acertar, o que os repórteres e colunistas políticos de Brasília chamam de “relevo submarino”.

Em termos metafóricos, a expressão é usada para descrever o que está no fundo do mar, rios ou lagoas e só aparece nos períodos mais rigorosos de estiagem, quando o nível da água cai drasticamente. No plano político, a expressão é utilizada para classificar ministros escolhidos em final de mandato ou, então, por presidentes intempestivos, incoerentes e intelectualmente limitados. 

Em ambos os casos, quem tem biografia, currículo sólido e sem informações falsas e bom nome quase sempre recusa o convite para não macular sua imagem profissional ou não perder a oportunidade de ser lembrado para compor o ministério de um futuro governo. Com isso, presidentes em final de mandato ou aqueles que perderam credibilidade sem ter chegado a completar o segundo ano de gestão só conseguem chamar para compor seu governo figuras menores, que em circunstâncias normais jamais seriam lembradas para ocupar um cargo de ministro. Esses são os “relevos submarinos” da vida política.

Desde que Abraham Weintraub se demitiu do MEC e fugiu do País, há 20 dias, quase todos os nomes cogitados pelo Palácio do Planalto para suceder-lhe têm esse perfil. Seja por pressão da ala ideológica liderada por um astrólogo apoiado pelos filhos do presidente, seja por intrigas palacianas e confabulações do Centrão, do ponto de vista de sua formação são profissionais com currículo bastante inferior ao dos membros do Conselho Nacional de Educação (CNE), muitos dos quais são professores titulares em instituições consagradas, e até mesmo ao de vários secretários estaduais de Educação. 

Desse modo, em que condições o quarto titular do MEC no governo Bolsonaro negociará com os demais dirigentes do setor educacional um plano cuidadoso de retomada das aulas, que leve em conta a distância mínima de alunos em sala de aula? Ou, então, que leve em conta a eventual necessidade de um novo período de isolamento, contrariando o voluntarismo de um chefe do Executivo que só vê a educação como uma arena do que chama de “guerra ideológica”? Nesta semana, o CNE aprovará um parecer para dar orientações sobre esse retorno. Mas, para serem adotadas, elas precisam ser homologadas por um ministério que, apesar de sua importância para a formação das novas gerações, se encontra acéfalo. Se tiver alguma discordância programática ou política, o novo ministro conseguirá negociar essas orientações? 

Além disso, como durante a pandemia de covid-19 o MEC foi omisso com relação ao esforço dos Estados para implantar às pressas um sistema de ensino a distância, o novo ministro terá de se superar para conseguir impor uma política nacional de ensino virtual. Por fim, os esforços que Estados e municípios desprenderam para tentar adequar suas redes de ensino ao período de pandemia aumentaram seus gastos com educação num momento de queda acentuada de arrecadação. Evidentemente, isso exige mais repasses da União. Que força um ministro que já assume sem peso político terá para lidar com uma equipe econômica que vê a austeridade fiscal como dogma? 

Sem esses repasses, em alguns Estados a situação ficará crítica e, com isso, o País ficará ainda mais distante das metas preconizadas pelo Plano Nacional de Educação para 2020. Infelizmente, os critérios que Bolsonaro já usou na escolha de três titulares do MEC não garantem que o quarto ministro será diferente dos anteriores. Se isso ocorrer, será um ganho surpreendente.