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A democracia e o município

São de grande relevância os estudos e análises que aportam luzes sobre a política na esfera local

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Por Notas&Informações
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A Fundação Konrad Adenauer Brasil lançou recentemente um novo número de sua série Cadernos Adenauer, com nove artigos dedicados às eleições municipais. Visto muitas vezes como algo de menor transcendência política e social, o pleito local é decisivo para a democracia. “Na minha experiência, a democracia é melhor ensinada nos municípios, pois ali o trabalho prático e o resultado de uma votação é imediatamente visível. Trabalhar a serviço da comunidade é, portanto, a melhor etapa preliminar para o trabalho no campo político em geral”, disse Konrad Adenauer que, antes de ser chanceler da Alemanha (1949-1963), foi prefeito de Colônia em duas ocasiões.

No artigo Eleições municipais legislativas: a porta de entrada na política e a mãe de todos os pleitos sob a realidade de 2020, Humberto Dantas e Bruno Souza da Silva registram que, “no anedotário político, o município sempre foi visto como o lugar de ausência de contestação (ausência de competição)”. No entanto, reconhecem que “as eleições municipais são competitivas (como é previsto num sistema democrático), partidos se alternam no poder e, de modo crescente, aumenta a oferta de candidatos à disposição dos eleitores”.

Em relação ao último tópico, o artigo traz números significativos. Segundo o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), nas eleições gerais de 2010 – que incluem a esfera central e a estadual – houve cerca de 22,5 mil candidaturas no País. Em 2014, 26 mil e em 2018, quase 30 mil. Já os números das eleições municipais são de outra ordem. Apenas para as câmaras municipais em 2008 houve 350 mil candidatos. Em 2012, 450 mil e em 2016, 460 mil.

Segundo Humberto Dantas e Bruno Souza da Silva, “o saldo verificado entre 2008 e 2012 está associado ao endurecimento da justiça em relação à interpretação da lei que obriga os partidos e coligações, vigentes em termos locais até 2016, a lançarem porcentuais mínimos de candidaturas do gênero minoritário na lista de postulantes, o que comumente está associado ao universo feminino. Essa decisão, sozinha, alterou significativamente o perfil dos candidatos, não só no que diz respeito ao gênero, mas também em termos de variáveis como estado civil e escolaridade”.

O artigo de Luiz Eduardo Garcia da Silva analisa os possíveis efeitos da proibição das coligações nas eleições proporcionais, instituída pela Emenda Constitucional (EC) 97/2017. Em primeiro lugar, o autor reconhece que “o fim da possibilidade de partidos firmarem coligações nas disputas proporcionais não necessariamente representará o fim dos puxadores de voto” – que era um dos efeitos prometidos com a EC 97/2017. Ao mesmo tempo, admite que a medida pode ter efeitos positivos na dinâmica da representação política, seja melhorando a eficácia das escolhas eleitorais por parte dos eleitores seja propiciando maior coesão interna aos partidos, “que buscariam reforçar sua imagem e projetos comuns frente ao eleitorado”.

Quanto ao efeito da diminuição do número de legendas, Luiz Eduardo Garcia da Silva afirma que, “estruturalmente, prevemos uma redução gradual do número de partidos políticos especialmente no âmbito municipal”. Destaca também que o efeito da proibição das coligações sobre a fragmentação partidária pode ser ainda mais forte em função da cláusula de barreira para partidos que não alcancem determinado porcentual de votos. A cláusula prevista na EC 97/2017 entrará em vigor em 2022.

O artigo de Garcia da Silva sugere ainda outro efeito especialmente positivo para a qualidade da representação. Com o fim das coligações, “o peso eleitoral de cada legenda será melhor equalizado na contagem dos votos, o que facilita a percepção do eleitor e facilita a sua própria tomada de decisões”.

Poucas esferas do Estado têm tanto impacto direto sobre a vida do cidadão como o Executivo e o Legislativo municipais. Por isso, são de grande relevância todos os estudos e análises que aportam luzes sobre a política na esfera local. O município importa e o eleitor precisa estar consciente disso.