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A educação que queremos

Ensino básico de qualidade e para todos tem de ser prioridade do próximo presidente, se o que se pretende é ampliar a capacidade dos brasileiros de participar da riqueza do País

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Por Notas & Informações
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A desastrosa gestão da educação durante o governo do presidente Jair Bolsonaro foi marcada por equívocos de todo tipo. Primeiro, o País perdeu tempo e oportunidades com o Ministério da Educação (MEC) dominado por uma agenda ideológica extremista e beligerante, cujo único propósito parecia ser a desconstrução das políticas educacionais existentes. Depois, quando a pandemia de covid-19 virou o mundo de cabeça para baixo e as escolas tiveram de ser fechadas, o que se seguiu foi a total omissão do MEC, inclusive no período de retomada das aulas presenciais. Por fim, denúncias de corrupção reveladas pelo Estadão, envolvendo pastores e até propina em ouro, trouxeram à tona o que se passava nos bastidores do Ministério. 

Sob Bolsonaro, o governo não só abdicou de seu papel de articulador nacional, como deu as costas a Estados, municípios e o chamado terceiro setor, que tanto contribui na busca de soluções. Ficou evidente que falta ao atual governo um projeto educacional e que a promessa de priorizar a educação básica não passava de palavras ao vento. Da parte do presidente da República, que até aqui já nomeou cinco ministros do MEC, o que se viu foi uma permanente e equivocada predisposição para encarar a educação como um reduto da esquerda − espaço de adversários ou inimigos na lógica bolsonarista.

Os últimos quase quatro anos, não resta dúvida, indicam claramente o que não deve ser feito − e é essencial que a próxima equipe a comandar o MEC tenha clareza disso. Qualquer que seja o resultado das urnas neste domingo, o Brasil terá pela frente o desafio de promover uma reviravolta na educação. Eis um consenso que sobrevive até mesmo à mais acirrada polarização eleitoral. O que fazer?

De uma vez por todas, este jornal considera que é preciso priorizar a educação básica. Não se trata de deixar de lado as universidades, até porque os professores do ensino fundamental e médio são formados nos cursos de pedagogia e licenciatura − e a formação docente é uma área a ser apoiada. Não se ignora aqui tampouco o papel estratégico do ensino superior na formação profissional, na pesquisa e no desenvolvimento do País. O ponto essencial, contudo, é que o Brasil tem mais de 40 milhões de alunos na educação básica e já passou da hora de assegurar, a todos e a cada um deles, o direito de concluírem o ensino médio com o nível de aprendizagem previsto nos currículos escolares – e isso exigirá um salto de qualidade sem precedentes.

Eis o caminho trilhado por nações que conseguiram superar o subdesenvolvimento, elevando a renda e melhorando as condições de vida de toda a sociedade. Não há mágica. Sem a elevação da escolaridade e dos níveis de aprendizagem, não há como sustentar longos ciclos de crescimento econômico, de geração de empregos e de ganhos de produtividade. Do próximo governo, seja qual for, é preciso o compromisso de canalizar esforços para melhorar a base da educação, se o que se pretende é reduzir as desigualdades sociais e ampliar a capacidade dos brasileiros de participar da riqueza do País.

Por pior que tenha sido o desastre dos últimos anos, é possível mudar o rumo. O Brasil tem exemplos positivos que devem servir de inspiração. Seja o modelo de alfabetização de crianças no Ceará, o ensino médio em Pernambuco ou as escolas em tempo integral que se espalham por diferentes Estados, incluindo São Paulo. Não há necessidade de reinventar a roda. O segredo, como indicam experiências exitosas em diversas redes de ensino público no País, é foco, gestão e continuidade − além dos recursos já assegurados pela Constituição. A estreita colaboração entre governos estaduais e prefeituras é outro passo indispensável.

Com sua capacidade de mobilização e as verbas de que dispõe, o MEC tem muito a fazer. Liderar um esforço emergencial de recomposição de aprendizagens, de combate à evasão escolar e de atenção à saúde mental dos estudantes seria um bom começo. Os próximos anos serão decisivos para a consolidação do Novo Ensino Médio e da Base Nacional Comum Curricular (BNCC). O Brasil não está condenado ao atraso educacional. É hora de agir e de eleger prioridades: a primeira delas, a educação básica.