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A hora do saneamento

É necessário que o Congresso aprove os vetos da Presidência ao Novo Marco

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Por Notas & Informações
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O cenário do saneamento no Brasil é triplamente adverso. Primeiro, porque a cobertura está abaixo da média de outros países com o mesmo estágio de desenvolvimento. Cerca de 35 milhões de brasileiros não são servidos por água potável e quase metade da população não dispõe de coleta de esgoto.

Segundo, porque o País tem investido bem abaixo da meta para atingir a universalização até 2033, estabelecida em 2013 pelo Plano Nacional de Saneamento (Plansab), de R$ 24,9 bilhões por ano. Na prática, o Brasil investiu apenas metade disso. Para piorar, os investimentos vêm caindo: entre 2014 e 2018 a redução foi de 12,3%.

Em terceiro lugar, há indícios de que a própria meta do Plansab esteja defasada. Um estudo da ABCON-KPMG estima que o investimento médio deveria ser de R$ 37,4 bilhões por ano, montante quase 40% maior do que o previsto pelo Plansab, e 2,6 vezes maior do que o investido em 2018.

Os dados constam de um diagnóstico do Instituto Trata Brasil sobre Investimentos em Saneamento, que, por sinal, registra um quarto fator agravante: as disparidades regionais. Em média, os Estados com os melhores índices de cobertura (em geral no Sudeste, Sul e Centro-Oeste) são os que estão investindo mais e os com menor cobertura (Norte e Nordeste) estão investindo menos.

De acordo com os indicadores da ABCON, apenas três unidades da Federação (São Paulo, Paraná e Distrito Federal) apresentam patamar de investimentos compatíveis com a meta da universalização em 2033. Sete Estados investem abaixo do previsto (entre 50% e 90% do necessário) e 17 investem muito abaixo (menos de 50% do necessário).

Felizmente, o Novo Marco do Saneamento aprovado neste ano facilitou, entre outras coisas, as parcerias, concessões e investimentos privados. Estima-se que os investimentos devem crescer em média 4,1 vezes em relação aos aportes atuais. Entre os 24 Estados com investimentos insatisfatórios, 8 já têm estudos ou projetos de parcerias e/ou concessões em andamento. Os restantes precisam urgentemente de providências para aumentar os investimentos.

A esse respeito, não é possível exagerar a necessidade de o Congresso aprovar os vetos da Presidência da República ao Novo Marco. Sem eles, os contratos atuais das estatais poderão ser renovados por mais 30 anos sem licitação. Não por mera coincidência, a maior resistência vem justamente de bancadas do Norte e Nordeste, que, em escandalosa oposição ao bem-estar de suas populações, se mostram mais empenhadas em preservar os privilégios corporativos das empresas públicas que têm falhado fragorosamente na missão de prover a universalização do saneamento.

Garantir mais concorrência na celebração dos contratos não só é um meio para buscar a maior eficiência possível nos serviços, como atrairá mais investimentos privados, permitindo que os investimentos públicos sejam canalizados às regiões e populações mais carentes e menos atrativas para o mercado.

Um estudo do Ipea identificou que, dos 5.570 municípios nacionais, 961 – essencialmente no Norte e no Nordeste – apresentam alto grau de vulnerabilidade. Esses municípios – em geral com menos de 50 mil habitantes, na zona rural e com populações de baixa renda – exigem que se dê prioridade máxima nas condições de acesso aos recursos públicos. Somados a outros mil municípios em condições precárias, eles totalizam mais de 35 milhões de pessoas.

Segundo a pesquisa, além da alocação em novas obras, o Poder Público – em especial nestes municípios – deve objetivar cada vez mais o aumento da inclusão e a construção de infraestrutura física para acesso ao que é prioritário, de modo a inovar na gestão e acelerar medidas em andamento. Em resumo, trata-se de fortalecer a gestão local, capacitando seus prestadores de serviços e arranjo institucional; apoiando iniciativas que aumentem a eficácia dos investimentos e a autossuficiência da manutenção e operação dos sistemas; e promovendo ações integradas entre os três níveis da administração e entre políticas de temas correlatos ao saneamento, como gestão da água, do solo urbano e do meio ambiente.