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A maltratada competitividade

Produtividade do trabalho e qualidade do imposto são itens fora da pauta oficial

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Por Notas & Informações
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O governo precisa dar atenção à qualidade dos impostos e à formação da mão de obra, se quiser tornar o Brasil mais competitivo. Não basta pensar no peso da carga tributária e das obrigações trabalhistas. O custo do trabalho – para citar só um detalhe aparentemente esquecido pelo ministro da Economia – depende também da produtividade do trabalhador e, portanto, da educação. Esses alertas estão embutidos em novo estudo da Confederação Nacional da Indústria (CNI). O País só fica à frente da Argentina, num conjunto de 18 economias, na classificação apresentada no relatório Competitividade Brasil 2019-2020. Coreia do Sul, Canadá e Austrália, nessa ordem, aparecem nas posições mais altas.

O Brasil sempre ficou em penúltimo lugar nos estudos desse tipo – esse é o sétimo – realizados pela CNI desde 2010. A pontuação brasileira aumentou, graças ao avanço em alguns itens, como a facilidade para fazer negócios, mas a de outros países também cresceu e a penúltima posição foi mantida.

Juros altos, energia cara, transporte ruim e finanças públicas desarranjadas são deficiências bem conhecidas. Sem surpresa, as piores notas do Brasil correspondem aos itens financiamento, tributação, infraestrutura e logística, ambiente macroeconômico, ambiente de negócios e educação. Nesses itens o País aparece no terço inferior da classificação.

Só a Argentina supera o Brasil na ruindade dos impostos. A tributação brasileira, como sempre se lembra, é muito pesada. Correspondeu a 32,5% do PIB em 2018 e a 65,1% do lucro das empresas em 2019. Além disso, a gestão das obrigações tributárias consumiu muito tempo e o sistema de impostos e subsídios causa distorções na concorrência, segundo depoimentos de empresários.

Mesmo sem recorrer a pesquisas como a da CNI, é fácil lembrar alguns defeitos notáveis, como a tributação do investimento produtivo, a demora na recuperação de certos créditos e as diferenças de critérios nas 27 unidades da Federação. É preciso dar mais atenção, nos debates sobre a reforma tributária, às questões qualitativas. É preocupante a insistência do ministro da Economia, Paulo Guedes, em criar um tributo semelhante à extinta Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF).

Esse tributo é uma aberração. Pode ser fácil de cobrar, mas é regressivo, porque afeta mais duramente os pobres, e é desastrosamente cumulativo. Além de incidir sobre si mesmo, incide também sobre os demais tributos, ao se aplicar sobre a mera transferência de recursos. Não se trata, de fato, de um imposto sobre transações financeiras, como se diz, de forma equivocada, mas de uma cobrança sobre movimentações de dinheiro. A referência à qualidade dos tributos, no relatório da CNI, lembra imediatamente o risco de ver implantada, de novo, essa distorção.

Também merece atenção especial, nesse estudo sobre competitividade, a parte relativa ao custo da mão de obra. Para bem avaliar esse custo é preciso considerar a produtividade, como lembram os autores do relatório. O fraco desempenho do Brasil em relação a esse item é atribuível, segundo o estudo, à baixa eficiência do trabalho. Na Austrália, o país com melhor pontuação nesse quesito, cada trabalhador produziu US$ 109.645 em 2018, mais que o triplo do valor produzido pelo brasileiro (US$ 33.147). Abaixo do Brasil, nessa classificação, só ficou a Índia, em 18.º lugar, com produção média de US$ 21.882 por trabalhador.

Há uma conexão óbvia entre a produtividade e o sistema educacional. Em qualidade da educação o Brasil fica em 13.º lugar entre 15 países selecionados. Esse item é baseado em notas do Pisa, o programa internacional de testes sobre linguagem, matemática e ciências. O atual governo nada fez na educação, além de criar encrencas e atacar uma esquerdização imaginária. Quanto ao custo da mão de obra, o ministro da Economia tem-se concentrado no combate aos direitos trabalhistas e em promessas de cortar encargos da folha. Alguém estará preocupado, nesse governo, com a tal competitividade?