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A minirreforma trabalhista

Antes mesmo da votação pelo Senado, MPT já anunciou que a questionará no STF

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Por Notas & Informações
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Uma semana após a aprovação, pela Câmara dos Deputados, da minirreforma trabalhista promovida pela Medida Provisória (MP) 1.045, 15 procuradores do Ministério Público do Trabalho (MPT) divulgaram um documento no qual anunciam que questionarão a constitucionalidade daquele texto no Supremo Tribunal Federal (STF).

A iniciativa foi liderada pelo procurador-geral do Trabalho, José de Lima Ramos Pereira. Segundo ele, ao suprimir direitos trabalhistas, a minirreforma acarretará “consequências altamente danosas para a sociedade”. Originariamente, a MP 1.045 tinha por objetivo estimular a contratação, a formação e a qualificação profissional de jovens, enquanto durar a pandemia. Contudo, os ministros da Economia e do Trabalho e Previdência incluíram no corpo da MP vários dispositivos nos quais cogitavam há tempos, sob a justificativa de que propiciariam a transição desses jovens do mercado informal para o mercado formal de trabalho, com carteira assinada pelo empregador.

  Embora o texto aprovado pela Câmara tenha de passar pelo Senado e, depois, ser submetido à sanção do presidente da República, os procuradores afirmaram que decidiram recorrer ao STF antes do término desse processo porque a minirreforma trabalhista já está disseminando insegurança jurídica nos meios empresariais e sindicais. Segundo os procuradores, o governo não poderia ter introduzido novas regras trabalhistas numa MP que, originariamente, não previa mudanças de normas desse porte.

Os procuradores ensinam que tais mudanças somente podem ser feitas por meio de projetos de lei, que têm uma tramitação mais lenta e permitem o debate do tema por todos os setores interessados. Argumentaram, ainda, que, ao incluir sem discussão prévia a supressão de direitos numa MP cujo objetivo era estimular a formação profissional de jovens, o governo descumpriu uma convenção da Organização Internacional do Trabalho, ratificada pelo Brasil. Segundo a convenção, as alterações na Consolidação das Leis do Trabalho têm de ser debatidas previamente por uma comissão formada por representantes do governo, dos empregadores e dos empregados.

Entre as críticas feitas pelos procuradores às inovações introduzidas na MP e aprovadas pela Câmara destaca-se a redução de prerrogativas da Polícia Federal e do Ministério do Trabalho em matéria de fiscalização do cumprimento de normas sobre segurança no trabalho. Outro ponto criticado é a não previsão de direitos assegurados pela Constituição – como 13.º salário e Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – nos programas destinados à qualificação profissional de jovens. 

Os procuradores também criticam as restrições impostas aos fiscais do trabalho na aplicação de multas em empresas que desrespeitam normas de segurança do trabalho. Pelo texto aprovado pela Câmara, as empresas só poderão ser autuadas na segunda visita de um fiscal. O máximo que ele poderá fazer na primeira visita é orientá-las a sanar a infração. E, ao contrário do que ocorre hoje, as empresas faltosas ainda passam a ter o direito de questionar o auto de infração num conselho administrativo. 

“Retiram-se, assim, poderes punitivos e inibitórios da inspeção do trabalho, o que pode resultar em estímulo à prática de ilicitudes e incremento de acidentes, mortes e adoecimentos nas relações laborais”, afirmam os procuradores trabalhistas. Essas mudanças ferem o princípio do valor social do trabalho definido pela Constituição, concluem. Em resposta, o governo alega que essas inovações não diferem do que já consta em outros textos legais, como é o caso da Lei de Estágio, que não prevê direitos trabalhistas, pois seu objetivo é a qualificação do estagiário. 

Não há dúvida de que a minirreforma introduzida pela MP 1.045 afetará profundamente o mundo do trabalho. Por isso, o mais sensato seria que governo, representantes dos empregadores e dos empregados dialogassem sobre os pontos contestados pelos procuradores trabalhistas e chegassem a um acordo. Diante dos problemas que o País enfrenta, nestes dias de pandemia, não faz sentido algum judicializar a esse ponto as relações trabalhistas.