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A requalificação da construção

Entre 2012 e 2018, os investimentos em construção caíram de 12,7% do PIB para 7,9%

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Por Notas & Informações
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Segundo o Tribunal de Contas da União, no Brasil há mais de 14 mil obras paralisadas, totalizando R$ 144 bilhões em recursos. Além de problemas crônicos, como vícios de contratação e de planejamento, essas paralisações se devem à crise econômica e fiscal. Mais de 75% dessas obras foram iniciadas após 2013 e a frequência de paralisações se intensificou a partir de 2014. Entre 2012 e 2018, os investimentos em construção caíram de 12,7% do PIB para 7,9%. Para sanar esse déficit em obras de desenvolvimento urbano, infraestrutura e outras, será necessário investir na próxima década 9,3% do PIB projetado para o período. A estimativa consta do estudo Obras paradas da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp).

Não seria um esforço inédito nem díspar em relação aos padrões internacionais. Na década de 1970, o Brasil investiu 12,4% do PIB em obras e instalações e na década de 80, 14,8%. Em 2017, a média da OCDE foi de 10,1%, e em países em condições similares, como Chile ou México, foi, respectivamente, de 12,7% e de 12,2%.

Só na área de infraestrutura, segundo o estudo, o Brasil precisará elevar em 57,8% seus investimentos anuais em obras. Entre 2007 e 2018, a média foi de R$ 79,5 bilhões ao ano. Ela precisaria subir para R$ 125,4 bilhões. A estimativa leva em conta quatro setores. No mais deficitário, o de transporte, a média de investimentos desde 2007 foi de R$ 52 bilhões, e precisaria ser elevada para R$ 76,4 bilhões. Em energia elétrica, a média de R$ 16,1 bilhões precisaria chegar a R$ 21,8 bilhões. Já a média de petróleo e gás deveria subir de R$ 13,8 bilhões para quase R$ 20 bilhões. Finalmente, o setor de telecomunicações, que investiu em média R$ 6 bilhões por ano, precisaria investir R$ 8,2 bilhões.

Além da melhoria do cenário macroeconômico e da atuação do governo na formulação de bons projetos e avanços regulatórios, o primeiro passo para retomar o ciclo de obras da construção e elevar a competitividade do País é sanar as deficiências estruturais que têm levado à paralisação de tantas obras. Para tanto, o estudo faz um diagnóstico e, com base nele, prescreve algumas propostas saneadoras.

Em primeiro lugar, os governos federal e estaduais deveriam estabelecer forças-tarefa para analisar a situação das paralisações, buscando estabelecer a viabilidade de retomar as obras paradas e as prioridades nestas retomadas.

Um levantamento do Ministério da Economia identifica duas razões principais para as paralisações: vícios de contratação (responsáveis por 42% das paralisações) e falta de recursos financeiros (26%).

Em relação ao primeiro fator, o estudo recomenda adotar com maior amplitude procedimentos de pré-qualificação dos candidatos nas licitações, investir mais em estudos prévios e adotar seguros de obras mais robustos. Além disso, é necessário exigir das empresas licitadas projetos mais detalhados, com a respectiva Anotação de Responsabilidade Técnica dos profissionais que executam e realizam a revisão do orçamento, comparando informações de projeto, memoriais, orçamento e cronogramas físico e financeiro.

Em relação aos recursos financeiros é preciso, entre outras coisas: estabelecer projetos prioritários, não sujeitos ao contingenciamento de recursos públicos; aperfeiçoar o orçamento impositivo em desenvolvimento urbano e infraestrutura; melhorar procedimentos alternativos de solução de conflitos em contratos públicos; e definir procedimentos mais claros para pedidos de reequilíbrio econômico-financeiro. O estudo traz ainda propostas em outras áreas críticas, como fiscalização e controle (responsável por 9% das paralisações), burocracia (2%) e licenciamento ambiental (1,5%).

A cadeia produtiva da construção civil chegou a empregar 12,2 milhões de pessoas em 2014. De lá para cá, foram encerrados 2 milhões de postos de trabalho. À medida que a economia dá sinais de recuperação e as reformas de Estado avançam, é essencial corrigir esses vícios de origem para que as oportunidades que despontam no horizonte não voltem a ser desperdiçadas.