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A vitória de Netanyahu

Prevaleceram as velhas táticas do “Rei Bibi”: a excitação do ressentimento de ultraconservadores, da classe operária e dos judeus imigrantes contra as elites cosmopolitas e a desmoralização dos opositores

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Por Notas e Informações
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Ao conceder a Benjamin Netanyahu seu quinto mandato como primeiro-ministro, o eleitorado israelense optou pelo que entende como o status quo, prosperidade e segurança, mas a médio prazo isso pode significar a deterioração de ambas.

O crescimento da economia de Israel é superior à média dos países da OCDE. Na diplomacia, Netanyahu se aproximou de países na África, Ásia e América Latina. Beneficiando-se da ascensão das direitas nacionalistas, aproximou-se de Vladimir Putin e, sobretudo, de Donald Trump.

Sua hostilidade ao Irã mobilizou a Europa e os EUA contra os projetos nucleares de Teerã e aproximou Israel das potências árabes. Embora não tenha feito nada para encerrar a ocupação “temporária” dos territórios palestinos, restringiu os assentamentos nos grandes blocos, apostando na defesa ostensiva e evitando a deflagração de confrontos em larga escala.

Tal ideologia de resignação à insolubilidade dos conflitos na região, restando administrá-los da melhor maneira possível, foi apelidada por muitos de “antissolucionista”. Como resumiu a revista The Economist: “Temperamentalmente conservador, prudente quanto à mudança, governa como se Israel não precisasse de qualquer mudança. A economia vai bem para os bem de vida, ainda que milhões de pessoas não sintam assim. O status quo religioso permanece no lugar, apesar da opinião pública. Como o problema palestino não pode ser resolvido, ‘viveremos para sempre pela espada’, como ele disse em 2015”.

Tais políticas não foram discutidas nas eleições, nem pelo seu adversário atual, Benny Gantz, nem pelo anterior, Isaac Herzog, que se restringiram a questionar Netanyahu como o político mais apto para conduzir o país. Prevaleceram as velhas táticas do “Rei Bibi”: a excitação do ressentimento de ultraconservadores, da classe operária e dos judeus imigrantes de países eslavos e árabes contra as elites cosmopolitas e a desmoralização dos opositores, sobretudo as esquerdas, a imprensa e os árabes, como traidores da pátria.

Seus críticos insistem que ele só agravou o chamado trilema de Israel: manter o controle das terras do Jordão ao Mediterrâneo, um Estado judeu majoritário e uma democracia. Apesar do crescimento econômico, há déficits na saúde e no transporte, impostos onerosos e crescimento da desigualdade. Sua política do “nós contra eles” acentuou a polarização entre judeus e árabes, judeus da diáspora e israelenses, asquenazim e mizrahim, e religiosos e secularistas. E sua aliança com Trump provoca fissuras no apoio bipartidário do Congresso dos EUA e o dos judeus liberais americanos, os pilares de sustentação internacional de Israel.

Com o fim da guerra síria, o Hezbollah e o Irã retomarão suas hostilidades na fronteira norte, e este último dificilmente celebrará outro pacto antinuclear, como querem Netanyahu e Trump. Quanto aos palestinos, embora não tenha renunciado formalmente à solução dos Dois Estados, o premiê se inclina para um Estado limitado (e quimérico), no qual os palestinos “teriam todos os poderes para governar a si mesmos, mas nenhum dos poderes para ameaçar”. Na prática, sua única política é estimular os conflitos entre o Hamas e a Autoridade Palestina para que não se unam contra Israel.

Vulnerado por investigações de fraude e corrupção, Netanyahu se aproximou ainda mais de facções racistas e extremistas, que cobrarão suas promessas de campanha, como a anexação de territórios ocupados na Cisjordânia, o que seria catastrófico para os palestinos e para a estabilidade no Oriente Médio. A outra opção seria buscar uma coalizão mais ao centro com o partido de Gantz.

Muitos analistas consideram que Netanyahu, mais do que um ideólogo intransigente, é um pragmatista, que transpôs sua política pessoal de manutenção no poder a qualquer custo para a nação israelense, aparentemente satisfeita com ela. Essa hipótese será testada como nunca no novo mandato. Já a solução do drama palestino ficará, melancólica ou tragicamente, para um futuro incerto e cada dia mais distante.