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Afinal, que reforma tributária?

O Brasil precisa com urgência de uma reforma para modernizar e tornar mais funcional seu sistema de impostos, contribuições e taxas

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Por Notas & Informações
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O Brasil precisa com urgência de uma reforma para modernizar e tornar mais funcional seu sistema de impostos, contribuições e taxas, mas a tarefa poderá ser bem mais complicada do que parecem supor o ministro da Economia, Paulo Guedes, e os presidentes do Senado e da Câmara, o senador Davi Alcolumbre e o deputado Rodrigo Maia. Um grupo de senadores cobra do governo a sua proposta de reforma antes de se formar uma comissão mista para discutir o assunto e encaminhar um projeto unificado. Além disso, esse grupo critica a ideia de apressar a tramitação para liquidar o assunto no primeiro semestre. A rapidez é necessária, segundo os defensores de uma solução até junho, por causa da campanha eleitoral nos meses seguintes.

Aqueles senadores, segundo reportagem do Estado, têm vários argumentos e motivos para resistir à formação imediata da comissão mista. O movimento combinado entre o ministro da Fazenda e os presidentes das duas Casas pode resultar, por exemplo, em prioridade para o projeto já em tramitação na Câmara. Importantes interesses de Estados e municípios poderão ser negligenciados no caso de uma tramitação apressada. Além disso, como instalar uma comissão e iniciar o trabalho sem conhecer as propostas em jogo?

Esta objeção foi formulada com perfeita clareza pelo senador Tasso Jereissati (PSDB-CE): “Quero deixar aqui a pergunta: afinal de contas, qual é a reforma tributária?”. Esta é a cobrança mais importante – e a mais inquietante, quando se considera a importância econômica, política e social de uma ampla reformulação tributária.

A tarefa da comissão seria muito mais clara se consistisse em montar uma proposta única a partir de dois projetos já conhecidos, o do economista Bernard Appy, em tramitação na Câmara, e o do ex-deputado Luiz Carlos Hauly, em exame no Senado. Há diferenças consideráveis entre as propostas, mas também pontos de proximidade, como a importância atribuída a um Imposto sobre Bens e Serviços, a um Imposto Seletivo e à redução do número de tributos. As divergências incluem, entre outros aspectos, a competência normativa, as formas de partilha da arrecadação entre União, Estados e municípios e as formas e períodos de transição.

Mas a comissão mista, segundo o combinado até agora, será constituída para uma tarefa no mínimo incomum. O resultado final de seu trabalho deverá incluir as ideias apresentadas também pela equipe econômica do governo. Essas ideias são por enquanto desconhecidas. Pontos esparsos foram mencionados pelo ministro da Economia e por seus auxiliares em várias ocasiões, desde a instalação do governo, mas sem que se articulassem num projeto claro e coerente. A ideia de recriar o imposto sobre o cheque, a CPMF, pode ter sido abandonada, mas nem isso é claro.

Além do mais, falta conhecer um importante dado preliminar: qual seria o objetivo de uma reforma proposta pelo Executivo ou por ele apoiada? Não se fala sobre redução ou aumento da carga tributária. Se a carga for mantida, como redistribuir o peso dos impostos e contribuições? O ministro da Economia toca nesse detalhe quando trata da redução dos encargos trabalhistas, mas suas preocupações parecem quase limitadas a esse ponto.

A discussão, quando envolve representantes do Executivo, fica geralmente longe de temas como a inserção global do País, a competitividade, as possibilidades de incentivos, o fim da guerra fiscal, a facilitação do investimento produtivo e – muito importante – a tributação da economia digital, tema prioritário da OCDE, a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico.

Prioridade é a palavra usada também pelos presidentes do Senado e da Câmara, pelo presidente da República e pelo ministro da Economia, quando falam da reforma tributária. Mas falta explicar as mudanças contempladas, o sentido estratégico dessa reforma para a economia brasileira e os passos necessários para a implantação de um novo sistema. Instalado há pouco mais de um ano, o governo foi incapaz, até agora, de esclarecer essas questões.