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Amazônia: a união faz a força

Iniciativas inovadoras nutrem esperanças no desenvolvimento sustentável da região

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Por Notas & Informações
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Nenhuma região do mundo simboliza tão completamente os desafios ao ideal do desenvolvimento sustentável – isto é, a combinação de preservação ambiental e crescimento econômico – quanto a Amazônia.

Desde a Coroa portuguesa, passando pelo Império, Estado Novo e o regime militar, o Brasil sempre teve planos para a floresta. Mas, até meados do século 20, ela estava praticamente intacta e sua economia restrita ao extrativismo. A partir de então prevaleceu uma dinâmica de supressão da floresta em favor de atividades como a soja e a pecuária. Nas últimas décadas, esse modelo vem sofrendo severas recriminações de movimentos ambientalistas. Mas, a prevalecer os ideais de muitos deles, a floresta voltaria a permanecer intocada, relegando milhões de habitantes da região ao subdesenvolvimento perpétuo.

Hoje, há indícios de que uma nova consciência ganha corpo: não só há uma vanguarda ambientalista estimulando o desenvolvimento econômico da região, como ela tem recebido o apoio do capital financeiro, do agronegócio, do eleitorado e do establishment político.

Os três maiores bancos privados do Brasil, por exemplo, lançaram o “Plano Amazônia”, contemplando quatro prioridades: bioeconomia alicerçada em pesquisa, investimento, acesso a mercados internacionais e melhorias na cadeia de suprimento; desenvolvimento de culturas sustentáveis por meio de programas de crédito combinados à assistência técnica; apoio à pecuária não predatória; e mecanismos sustentáveis de regularização fundiária.

Com sadio realismo, o consórcio reconhece que, se crescimento e conservação são conciliáveis idealmente e a longo prazo, “não há panaceias ou soluções milagrosas capazes de contemplar simultaneamente e no curto prazo interesses tão diversos, seja do ponto de vista biológico, social, econômico ou geopolítico”. Ao mesmo tempo, aponta que “o êxito está fortemente ligado à cooperação com as diferentes iniciativas empresariais, de governo, da academia e do terceiro setor”.

Como mostrou uma série de reportagens do Estado para o Dia da Amazônia (5 de setembro), esta cooperação está se expandindo e se capilarizando em iniciativas solidárias como cooperativas, comunidades ribeirinhas que captam energia solar, ecoturismo ou novas técnicas que mostram como produzir mais carne sem grilagem.

Um estudo do Instituto Imazon mostra que, se 3% a 9,5% do crédito para a compra de gado for direcionado à recuperação de pastagens degradadas, é possível aumentar a produção sem derrubar a floresta. O Instituto Peabiru criou um projeto para impulsionar a comercialização de produtos tradicionais do Pará por meio de técnicas modernas de marketing, venda e logística. Iniciativas cruciais são as que estimulam o processamento local dos produtos primários, agregando valor à cadeia agrícola.

Segundo Salo Coslovsky, pesquisador da Universidade de Nova York, há 64 produtos que podem ser explorados na floresta sem provocar desmatamento. Esses produtos já geram uma receita de US$ 300 milhões ao ano. Para dar uma ideia de seu potencial, o mercado global desses produtos atinge US$ 180 bilhões, mas a Amazônia, com 30% das florestas tropicais do mundo, tem uma participação abaixo de 0,2%.

Segundo pesquisa do Instituto Clima e Sociedade, para a maioria dos brasileiros a proteção ambiental é precondição ao desenvolvimento, e para 80% a Amazônia deve ser prioridade nas eleições de 2022. Na Câmara, um grupo de deputados está preparando uma pauta de temas consensuais em condições de serem votados antes da Conferência da ONU sobre Mudanças Climáticas, em novembro.

Tomadas isoladamente, essas iniciativas não garantem que o Brasil conseguirá reprimir as forças predatórias responsáveis pela escalada no desmatamento da Amazônia nos últimos dois anos. Mas elas provam que há suficientes recursos no País para encarar este desafio com um otimismo realista. Tudo dependerá da capacidade desses agentes de unir forças em prol de uma agenda sustentável. Se conseguirem, darão um exemplo para o mundo.