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Aperto das famílias emperra o PIB

Inflação, juro alto e orçamento apertado freiam o consumo familiar, atrapalham os negócios e dificultam o crescimento

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Por Notas & Informações
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Com dinheiro curto, preços em disparada e juros altos, as famílias seguram os gastos e impõem um freio ao crescimento da economia, como apontam os números de maio do Monitor do PIB-FGV, a mais detalhada prévia mensal do Produto Interno Bruto (PIB). O consumo familiar, um dos principais motores da produção, diminuiu 2,1% entre abril e maio. Com o aperto do orçamento e o crédito caro, reduziram-se as compras de produtos menos essenciais, como produtos semiduráveis e duráveis, comentou a coordenadora da pesquisa, Juliana Trece.

“Após três meses consecutivos de crescimento, a economia retraiu-se 0,8% em maio”, resumiu a coordenadora. A produção industrial voltou a recuar, depois de alguns meses de expansão. A atividade continuou, no entanto, em níveis superiores aos do ano passado. Em maio, o PIB foi 4,4% maior que um ano antes. No trimestre móvel, superou por 3,7% o resultado de igual período de 2021. Também nos meses de março a maio o consumo das famílias foi 5,8% superior ao de um ano antes.

Apesar de algum avanço em relação a 2021, o quadro geral da economia continua marcado por baixo dinamismo industrial e por más condições no mercado de trabalho. Mesmo com alguma diminuição, o desemprego permaneceu elevado nos primeiros cinco meses do ano, assim como a informalidade e a subutilização da mão de obra. Não há referência a esses detalhes no relatório divulgado pela FGV, mas a desocupação, o desalento, a subocupação e a informalidade obviamente afetam as condições de consumo das famílias.

Não por casualidade, o número de consumidores inadimplentes chegou a 66,6 milhões em maio, atingindo novo recorde, segundo levantamento periódico da Serasa Experian. Muitos inadimplentes, como têm mostrado algumas pesquisas, se endividaram em bancos para pagar outras dívidas e acabaram sem condições de ajustar sua vida financeira. Os dados negativos do consumo refletem, portanto, mais do que o aperto crescente do orçamento familiar. Refletem também o drama de um número crescente de famílias atoladas em dívidas.

Mais do que uma economia em marcha lenta, o Monitor mostra um país com pouco potencial de crescimento nos próximos anos. O investimento em capital fixo, isto é, em máquinas, equipamentos e obras, aumentou 1,6% entre abril e maio, mas ainda correspondeu a 19,3% do PIB. Uma taxa de 25% seria mais parecida com os padrões observados em emergentes mais dinâmicos que o Brasil. Investimento em capacidade produtiva depende de confiança nas condições econômicas e políticas do País.

Com ações improvisadas e eleitoreiras, o presidente Jair Bolsonaro e seus aliados têm, no entanto, semeado insegurança entre empresários e investidores. A instabilidade cambial, o dólar caro e seus efeitos inflacionários são reflexos das incertezas presentes nos mercados. Projeções de crescimento econômico iguais a 2% neste ano e nos próximos são demonstrações de muito otimismo, embora apontem um desempenho econômico muito inferior ao previsto para os emergentes e também para alguns países avançados.