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Bolsonaro e os governadores

O presidente tem inviabilizado qualquer forma de diálogo com a maioria dos governadores, além de complicar-lhes a administração naquilo que pode

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Por Notas e Informações
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Vinte governadores, de todas as tendências políticas, assinaram uma carta aberta a Jair Bolsonaro para cobrar do presidente da República “equilíbrio, sensatez e diálogo”. A mensagem foi uma reação às declarações de Bolsonaro segundo as quais o governador da Bahia, Rui Costa (PT), “mantém fortíssimos laços” com bandidos e que a “PM da Bahia, do PT”, teria praticado uma “queima de arquivo”, no caso da morte do miliciano Adriano Magalhães da Nóbrega em confronto com a polícia no dia 9.

Pode-se dizer que as afirmações de Bolsonaro na verdade foram a gota d’água numa relação já bastante tumultuada entre o presidente e os governadores. Há poucos dias, Bolsonaro desafiou os governadores a zerarem o ICMS incidente sobre os combustíveis, afirmando que o preço da gasolina continuava alto nos postos porque os Estados não querem abrir mão de receita. Os governadores reagiram, afirmando, também por meio de mensagem coletiva, que não se pode discutir questões tributárias importantes como essa de maneira tão ligeira e populista. Em julho do ano passado, Bolsonaro ofendeu os governadores dos Estados do Nordeste, chamando-os de “governadores de paraíba”. Em resposta, esses governadores assinaram uma mensagem para manifestar “profunda indignação”.

Nas três cartas, os governadores enfatizaram a necessidade de interlocução e colaboração entre os Estados e o governo federal. Esse deveria ser o espírito a presidir as relações da União com os entes da Federação.

É natural que eventualmente haja algum estremecimento do presidente com este ou aquele governador, em circunstâncias próprias do jogo de poder – e não é possível ignorar que alguns governadores acalentam o sonho de chegar à Presidência na eleição de 2022, sendo, portanto, potenciais adversários de Bolsonaro nas urnas. Mas o que se vê entre Bolsonaro e os governadores extrapola os limites do simples embate político. O presidente tem inviabilizado qualquer forma de diálogo com a maioria dos governadores, além de complicar-lhes a administração naquilo que pode, mesmo quando isso representa prejuízo para as populações locais, justamente no momento em que o governo mais precisa de apoio para aprovar as reformas que pretende encaminhar ao Congresso.

Uma das reformas mais importantes, a tributária, por exemplo, depende de dura negociação com os Estados, que vivem situação fiscal precária e precisam da manutenção ou até da ampliação da receita para fechar as contas.

“O presidente Bolsonaro não quer aproximação com o Congresso, não quer aproximação com os governadores. Mas nós todos fomos eleitos”, disse o governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha (MDB), que desde sempre apoiou o presidente. “Só estamos pedindo um pacto federativo para recuperar a República. Se ele quer se afastar da política, não quer os governadores, isso é uma decisão dele”, declarou o governador.

Bolsonaro faria bem se prestasse atenção aos apelos dos governadores, expressos em declarações e nas cartas abertas que assinaram em resposta aos ataques presidenciais. Na mais recente, os governadores dizem que essas ofensas “não contribuem para a evolução da democracia no Brasil”. Afirmam também que “é preciso observar os limites institucionais com a responsabilidade que nossos mandatos exigem”. Finalmente, lembram que somente “trabalhando unidos conseguiremos contribuir para melhorar a qualidade de vida dos brasileiros”. A carta termina dizendo que “juntos podemos atuar pelo bem do Brasil e dos brasileiros” e convida Bolsonaro a participar do Fórum Nacional dos Governadores, marcado para o dia 14 de abril.

Esse gesto de conciliação dos governadores é uma oportunidade de ouro para que Bolsonaro finalmente se mostre à altura do cargo que ocupa, exercendo a Presidência no interesse de toda a Federação, sem criar atritos desnecessários ou perder energia com assuntos pouco relevantes para os destinos do País. O momento exige que considerações eleitoreiras, e principalmente familiares, sejam colocadas em segundo plano diante da necessidade urgente de convergência para a aprovação das reformas.