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Coalizão pelo clima

É preciso honrar a tradição do País em proteger o meio ambiente

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Por Notas & Informações
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Uma das três “urgências” do País enumeradas pelo novo ministro das Relações Exteriores, Carlos França, em seu discurso de posse é o compromisso com o desenvolvimento sustentável. A principal, não haveria de ser outra, é o combate à pandemia de covid-19, mas, embora seja uma urgência “em outra escala de tempo”, a proteção do meio ambiente não pode seguir tão negligenciada como tem sido pelo governo de Jair Bolsonaro. É alentador, portanto, saber que tema tão importante esteja no radar do Itamaraty, pois no do Ministério do Meio Ambiente parece não estar.

Se o chanceler acertou ao classificar como “urgente” a adoção de medidas de contenção das mudanças climáticas, cometeu um erro de diagnóstico ao afirmar que diante da Nação está a “oportunidade de manter o Brasil na vanguarda do desenvolvimento sustentável e limpo”. Ora, não se pode manter o que foi perdido.

Caso faça tudo certo daqui para a frente no que tange à preservação do meio ambiente, talvez o presidente Jair Bolsonaro possa restabelecer a posição do País como interlocutor respeitável em questões ligadas à agenda ambiental nos fóruns globais. Como um dos 40 países convidados pelo governo dos Estados Unidos para a Cúpula dos Líderes sobre o Clima, nos dias 22 e 23 deste mês, o Brasil terá a oportunidade de mostrar ao mundo se está, de fato, comprometido com metas ambiciosas de redução das emissões de carbono. O Brasil é o 6.º maior emissor de gases de efeito estufa do mundo e o desmatamento ilegal é o maior responsável por esta posição que em nada honra o País.

A Coalizão Brasil, Clima, Florestas e Agricultura, um movimento que reúne mais de 280 empresas e instituições ligadas ao agronegócio, ao setor financeiro e à academia, enviou uma carta ao presidente Bolsonaro em que sugere a adoção de seis medidas que podem reposicionar o Brasil em lugar de destaque nas discussões sobre o clima. São elas: intensificar ações de fiscalização ao desmate ilegal, finalizar a implementação do Cadastro Ambiental Rural (CAR), destinar 10 milhões de hectares à proteção e uso sustentável, conceder financiamentos sob critérios socioambientais, dar total transparência e eficiência às autorizações de supressão da vegetação e interromper processos de regularização fundiária de imóveis com desmatamento após julho de 2008.

Na carta, os empresários, acadêmicos e ativistas lembram que “o Brasil é país-chave nos esforços globais para o equilíbrio climático do planeta”, mas, diante do que chamam de “redução do nível de ambição” do ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, em fixar metas mais arrojadas de combate aos desmatamentos ilegais, o País tem perdido não só o soft power conquistado após anos e anos de trabalho responsável, mas também os investimentos estrangeiros. Ou seja, a postura de negação do governo Bolsonaro, que não se limita à crise sanitária, mas também abarca a crise climática e a responsabilidade do Brasil na sua solução, custa muito dinheiro, além do dano à imagem, intangível.

Dois pontos merecem especial destaque na carta enviada ao presidente Bolsonaro pela Coalizão Brasil. O primeiro são seus signatários. Entre as empresas e instituições que assinam o documento estão Amaggi, Bradesco, Carrefour, Cargill, Duratex, Gerdau, Imazon, Instituto Ethos, Itaú, Klabin, Santander, Suzano, UBS, Unilever e WWF Brasil. Ou seja, não são “ONGs esquerdistas” com propósitos obscuros, como o governo costuma tratar toda e qualquer organização que critica sua política ambiental, se é que há uma. São organizações sérias, com histórico de relevantes ações de preservação ambiental.

Outro ponto importante é que a adoção das seis medidas que a Coalizão Brasil sugere não requer mudanças na atual legislação, vale dizer, o que o grupo pede é simplesmente o cumprimento de leis vigentes.

A legislação ambiental do Brasil, de fato, é uma das mais avançadas do mundo. Não foi por obra do acaso que o País, ao longo dos anos, conquistou uma posição de destaque na proteção do meio ambiente. É preciso honrar este legado.