Imagem ex-librisOpinião do Estadão

Comércio volta ao nível pré-covid

Em dois meses as vendas do varejo sobem mais que a produção industrial

Exclusivo para assinantes
Por Notas & Informações
3 min de leitura

O consumidor voltou às compras, os varejistas veem o faturamento crescer e o auxílio emergencial, ao contrário da cloroquina, tem sido um remédio de efeito comprovado. No varejo, o volume vendido, depois de aumentar 14,4% em maio e 8% em junho, retornou, até com pequena folga, ao nível de fevereiro, quando o novo coronavírus ainda parecia um risco distante. Na indústria a recuperação tem sido bem mais lenta. Tendo caído 26,6% em março e abril, a produção continuou, no fim do semestre, abaixo do patamar anterior à queda.

Para os lojistas a vida está mais próxima da normalidade. No semestre, a receita nominal foi parecida com a de um ano antes (+0,1%). Em 12 meses houve até um avanço de 2,8%, embora o volume tenha aumentado apenas 0,1%. Mas o volume vendido em seis meses foi 3,1% menor que o contabilizado de janeiro a junho de 2019. Na comparação com o ano anterior, foi o pior semestre desde o segundo de 2016 (-5,6%), ainda na última recessão.

Mas o mundo se move e também o dia a dia das famílias se aproxima do normal, depois do distanciamento social mais severo. As pessoas continuaram comendo e usando produtos de higiene e limpeza, na fase de isolamento. As vendas de farmácias e de supermercados parecem ter crescido modestamente, nos dois meses finais do semestre, mas só porque foram menos afetadas no pior momento da crise. A história é diferente no caso de vários outros bens. As vendas de tecidos, vestuário e calçados diminuíram 42,2% em março e 68,8% em abril. Com a reação, aumentaram 96,3% em maio e 53,2% em junho.

A melhora é mais sensível quando se trata do comércio mais voltado para o dia a dia das famílias, como alimentos, produtos de higiene, beleza e limpeza, roupas, sapatos, eletrodomésticos, livros, jornais e papelaria. Bens como esses aparecem agrupados em oito grandes categorias. Para um quadro mais completo é preciso acrescentar duas categorias: veículos, motos e seus componentes (+35,2%) e material de construção (+16,6%). Os dez grandes grupos compõem o varejo ampliado. Considerado esse conjunto, o volume vendido em junho foi 12,6% maior que o de maio e 0,9% menor que o de um ano antes.

As vendas de veículos continuaram insuficientes, depois de dois meses de recuperação, para retornar ao nível anterior à queda. Em junho, as unidades vendidas ainda ficaram 13,7% abaixo do total comercializado em igual mês de 2019. A comparação entre os primeiros semestres mostra um resultado, em 2020, 21,8% inferior ao de um ano antes.

O efeito da pandemia no movimento das lojas e no ritmo das fábricas permaneceu, em junho, bem visível nos dados industriais. Nesse mês, a expansão de 8,9% na produção geral da indústria foi puxada principalmente pelo avanço mensal de 70% no ramo de veículos automotores, carrocerias e reboques. Com isso, o setor de veículos cresceu 495,2% ao longo de dois meses, mas ainda se manteve 53,7% abaixo do patamar de fevereiro. O crescimento acumulado em maio e junho só é explicável pela quase completa paralisação do setor automobilístico em abril.

Antes da pandemia, a produção automobilística já refletia a recessão na Argentina, o mais importante mercado importador de veículos e tratores fabricados no Brasil. Com o novo coronavírus, a retração dos negócios espalhou-se pela América do Sul. Com isso, as exportações brasileiras de veículos e de outros manufaturados foram prejudicadas mais severamente.

O pior momento da atual crise provavelmente ficou para trás. Economistas do setor financeiro e das grandes consultorias têm revisto seus cálculos. Em um mês a contração econômica estimada para 2020 passou de 6,10% para 5,62%, pela mediana das projeções. O crescimento esperado para 2021 foi mantido em 3,50%, mas sobre uma base mais alta. Mas há muita incerteza sobre como ficarão os negócios quando se esgotarem as ações emergenciais contra a crise. É um tema especialmente complicado, porque as contas públicas, em janeiro, estarão em condição bem pior que a prevista antes da pandemia. Qualquer erro poderá custar muito.