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Critérios para a improbidade

Para reduzir insegurança jurídica, estabeleceu-se o dolo como requisito para a improbidade

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Por Notas & Informações
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No dia 6, o Congresso concluiu a votação do Projeto de Lei (PL) 2.505/21, antigo PL 10.887/18, que revisa a Lei de Improbidade Administrativa (Lei 8.429/92). Ainda que a nova redação tenha suscitado alguma preocupação, trata-se de uma atualização necessária. Em vez de coibir os malfeitos na gestão pública, a Lei de Improbidade Administrativa (Lei 8.429/92) provocou insegurança jurídica sobre toda a máquina pública.

Com uma redação ampla, a Lei de Improbidade Administrativa não dificultou a vida apenas dos maus gestores. Ela gerou problemas para todas as pessoas que trabalham na administração pública, também para quem atua de maneira correta. Essa vagueza também permitiu que o Ministério Público usasse, em muitos casos, a Lei 8.429/92 como instrumento de contestação política.

O desequilíbrio da Lei de Improbidade Administrativa levou, assim, a que muitos profissionais se negassem a colaborar no serviço público, pelo receio dos processos judiciais que depois teriam de enfrentar. Também provocou o chamado “apagão das canetas”. Para evitar processos por improbidade, gestores deixaram de tomar decisões, esperando ser obrigados pela Justiça a atuar. Além de piorar a qualidade do serviço público, essa deliberada omissão conduz a uma inversão de funções. Decisões de natureza executiva, que deveriam ser tomadas por quem tem responsabilidade política, eram definidas pelo Ministério Público ou pelo Judiciário.

Para diminuir a insegurança jurídica e proteger os gestores que atuam de boa-fé, o PL 2.505/21 estabelece, como requisito para a improbidade, o dolo por parte do agente público. Ficam excluídas de responsabilização no âmbito da Lei 8.429/92 tanto as condutas culposas como as decorrentes de divergência na interpretação da lei.

O PL 2.505/21 também define com maior precisão as condutas que constituem ato de improbidade administrativa, o que é uma importante melhoria. O gestor público deve saber, com segurança, o que pode e o que não pode fazer no cargo. Houve também mudanças processuais. Em conformidade com o caráter sancionador das ações de improbidade, a legitimidade para sua propositura será exclusiva do Ministério Público, que também poderá celebrar acordos de não persecução cível. O juiz terá a opção de converter sanções em multas.

O ponto que suscitou maiores dúvidas no PL 2.505/21 se refere ao nepotismo. “Nomear cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, (...) para o exercício de cargo em comissão ou de confiança ou, ainda, de função gratificada” passa a integrar o rol de condutas que constituem ato de improbidade administrativa. No entanto, mais adiante, o texto prevê que “não se configurará improbidade a mera nomeação ou indicação política por parte dos detentores de mandatos eletivos, sendo necessária a aferição de dolo com finalidade ilícita por parte do agente”.

Assim, em algumas situações, a nomeação de parente não será considerada ato de improbidade. De toda forma, o nepotismo, sejam quais forem suas circunstâncias, continua proibido no País. Em decisão vinculante proferida em 2008, o Supremo entendeu que a nomeação de cônjuge, companheiro ou parente até o terceiro grau viola a Constituição.

Houve muitas críticas contra o PL 2.505/21, acusando-o de favorecer a impunidade e a corrupção. A esse respeito, deve-se ressaltar que a tramitação apressada do projeto na Câmara, sob regime de urgência, suscitou naturais dúvidas sobre a idoneidade da proposta. O Legislativo podia e devia ser mais cuidadoso, especialmente com um texto cujo objetivo é extinguir dúvidas e prover segurança.

De toda forma, a Lei de Improbidade Administrativa, como o próprio nome indica, não tem natureza penal. A legislação relativa aos crimes contra a administração pública permanece exatamente igual. O que precisava – e em boa medida foi feito – era rever o marco jurídico sobre a improbidade administrativa, de forma a punir os ímprobos e respeitar quem age de boa-fé.