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Deficiências do ensino médio

Educação sem avanço rumo à excelência é passo atrás no desenvolvimento

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Por Notas & Informações
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“Não há hoje nenhuma rede estadual de ensino garantindo o nível de aprendizagem que os alunos precisam ter no ensino médio”, constata a pesquisa Excelência com Equidade no Ensino Médio promovida pelo Interdisciplinaridade e Evidências no Debate Educacional (Iede), Fundação Lemann, Instituto Unibanco e Itaú BBA. Segundo o Sistema de Avaliação da Educação Básica, dos estudantes da rede pública que ingressam no ensino médio, apenas 34% têm aprendizado adequado em português e 15%, em matemática. Desde 2005, 14 Estados tiveram queda na proficiência de português e 16 na de matemática. Apesar disso, há exemplos de boas práticas que merecem ser intensificadas e replicadas.

De um total de 5.042 escolas públicas, os pesquisadores identificaram apenas 100 (2%) que atingiram critérios mínimos de qualidade, como taxas de aprovação acima de 95%, proficiência satisfatória em português e matemática e desempenho acima da média no Enem. O foco do estudo foi identificar os elementos diferenciais dessas escolas. Um primeiro elemento é regional: 55 dessas 100 escolas estão no Ceará, seguido por Pernambuco, com 14. Na Região Sul, apenas duas escolas passaram pelo crivo, e na Região Norte, só uma.

O dado que mais chama a atenção de gestores e pedagogos é que a maioria dessas escolas funciona em tempo integral. É uma tendência em quase todos os Estados, mas morosa: em 2014, as escolas de ensino integral representavam 5,4% do total, e hoje são quase 10%. Lamentavelmente, o governo federal chegou a acenar com um programa de fomento ao ensino integral, mas recuou desse propósito.

De um modo geral, o currículo integral é composto por duas partes, uma comum, com o repertório de disciplinas fundamentais, e outra diversificada, com matérias eletivas, projetos e dinâmicas alternativas. Assim, além da transmissão de conteúdos, esse modelo “abre mais espaço para trabalhos autorais dos estudantes - projetos interdisciplinares que proporcionam a aplicação prática dos conteúdos, com estímulo à conexão de saberes, à reflexão e à expressão mais ampla das habilidades de cada um, produzindo conhecimento e formando pensamento crítico”, diz a pesquisa.

Os ganhos são evidentes: 82 das 100 escolas mais qualificadas da rede pública são integrais. Mas há muitos desafios à sua replicação. Em primeiro lugar, é um modelo que não atende todos os estudantes. Quatro em cada dez alunos da rede pública exercem atividade remunerada após as aulas, imprescindível para a economia doméstica da maioria. De resto, é um modelo evidentemente custoso. Se for bem implementado, traz, por óbvio, retorno, mas, se não for, pode acarretar desperdício de recursos, algo particularmente crítico na atual conjuntura de austeridade fiscal. 

Outra constatação do estudo é que, se no ensino fundamental o bom desempenho das escolas está associado a intervenções diretas das secretarias de cultura com vistas a qualificar a formação e os formadores, no ensino médio o suporte não costuma ir além do monitoramento de indicadores. Assim, há poucas políticas de capacitação de professores do ensino médio, e o resultado delas é bastante modesto.

Em conclusão, os pesquisadores afirmam, com base em estudos internacionais consolidados, que seis aspectos são comuns aos melhores sistemas educacionais. No Brasil, três deles são verificados nas melhores escolas: primeiro, elas trabalham para garantir um bom clima escolar; depois, possuem uma gestão focada na aprendizagem dos alunos; e, finalmente, realizam avaliações que apontam intervenções pedagógicas necessárias. Contudo, nos três outros elementos, a saber, o currículo como norte central, o financiamento mínimo necessário e a formação de professores, há uma carência generalizada, especialmente no último. O desafio é grande, mas não há alternativa senão enfrentá-lo. Cada dia que a educação não avança rumo à excelência é um passo atrás no caminho do desenvolvimento.