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Descompasso com o mundo

O Brasil deve crescer apenas 1,4% neste ano e perder mais espaço na economia global

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Por Notas e Informações
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Travado pela incerteza, o Brasil deve crescer apenas 1,4% neste ano e perder mais espaço na economia global, segundo as novas projeções da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). O desempenho poderá ser melhor em 2020, com expansão de 2,3%, se empresários, investidores e consumidores estiverem mais confiantes. Mas isso dependerá de avanço na pauta de ajustes e reformas, com destaque para a mudança da Previdência. Ao acentuar a importância da agenda reformista, os técnicos da OCDE repetem e reforçam a análise dominante no País. O crescimento agora estimado para a economia brasileira em 2019 é 0,5 ponto menor que o calculado em março. A distância em relação à maior parte do mundo é ampla e crescente. O produto mundial deve aumentar 3,2% em 2019 e 3,4% no próximo ano. Na estimativa anterior, o Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil se expandiria 2,4% em 2020.

O Brasil perdeu o passo na corrida internacional já antes da recessão de 2015 e 2016. No caso do crescimento industrial, o descompasso começou mais cedo. Os primeiros sinais fortes de estagnação da indústria surgiram, nas estatísticas oficiais, em 2012. Instituições multilaterais, como o Fundo Monetário Internacional (FMI) e a OCDE, têm chamado a atenção, há anos, para os principais entraves ao crescimento brasileiro, ressaltando o desajuste das contas públicas, a tributação inadequada, a infraestrutura ruim, a formação insuficiente de capital humano e o excessivo fechamento do País.

Esses fatores são direta ou indiretamente abordados na análise das condições brasileiras, no material publicado ontem pela OCDE. A inflação baixa é um dos aspectos positivos da economia brasileira neste momento. Assim deverá permanecer por algum tempo e por isso os juros básicos dificilmente serão elevados neste ano.

A curto prazo, a reforma da Previdência, reduzindo as incertezas, poderá criar um ambiente favorável à aceleração dos negócios. Em prazo mais longo, a sustentação do crescimento dependerá também de outros fatores. Será preciso conter os gastos obrigatórios, como os salários do funcionalismo, para melhorar o gasto público. Isso poderá favorecer a educação e a assistência à saúde e permitir uma redução da desigualdade. Será necessário, além disso, mexer no fragmentado sistema de impostos e cuidar da segurança jurídica.

Maior abertura, maior integração internacional e maior competição também serão necessárias para ganhos de eficiência. De modo geral, essas várias mudanças poderão proporcionar ganhos importantes de produtividade. O aumento da produtividade, segundo a análise da OCDE, será o principal motor do crescimento econômico no longo prazo.

O relatório chama a atenção para dois fatores especialmente importantes neste momento – o cenário político fragmentado e a “relação às vezes desafiadoras entre ramos do governo”, mais conhecidos no Brasil como Poderes da República.

Essa relação complicada, segundo o relatório, tem dificultado a formação de consensos políticos para reformas fundamentais. Se o Congresso deixar de aprovar a agenda reformista do Executivo, o teto de gastos poderá ser violado já em 2020. Em contrapartida, o apoio à pauta de reformas poderá criar o clima necessário a uma nova etapa de forte crescimento. Diplomaticamente, os autores da análise se abstiveram de avançar nos detalhes da “desafiadora relação” entre os Poderes e dos erros e responsabilidades de cada um de seus chefes.

Globalmente, o risco mais destacado no relatório é o conjunto de tensões comerciais. Estados Unidos e China são os contendores principais, mas um agravamento das disputas envolverá também a Europa. Como outros países, o Brasil será afetado se esses conflitos prejudicarem o crescimento global. Mas a análise oferece uma advertência especial ao Brasil: China e Estados Unidos são os dois maiores parceiros comerciais do País. Nessa briga, convém acrescentar, o alinhamento às políticas do presidente Donald Trump em nada servirá aos interesses brasileiros.