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Desinformação viceja na leniência

Não bastam as boas intenções das ‘big techs’. Para combater a desinformação nas redes sociais de modo eficaz, ter agilidade na remoção de conteúdo enganoso é fundamental

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Por Notas&Informações
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É certo que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), os partidos políticos e a imprensa profissional, além dos próprios eleitores, estão mais bem preparados para lidar com a desordem informacional do que estavam há quatro anos. Muitas lições foram aprendidas de 2018 para cá. Isso não significa, no entanto, que a eleição de 2022 esteja totalmente blindada contra a influência de mentiras disseminadas por candidatos e seus apoiadores. Longe disso.

Tanto é assim que, em boa hora, uma das ações preparatórias adotadas pelo TSE para a realização do próximo pleito foi convidar as grandes empresas de tecnologia que administram as redes sociais para, juntos, adotarem medidas que visam à despoluição do debate público. Os eleitores devem tomar suas decisões com base em informações fidedignas. Em última análise, trata-se de salvaguardar a própria democracia.

Em uma primeira rodada, reuniram-se com as autoridades do TSE representantes do Twitter, TikTok, Kwai, Telegram, Meta (Facebook, Instagram e WhatsApp) e Google (YouTube). Depois, a Corte Eleitoral também firmou parcerias com o LinkedIn e com o Spotify. A boa notícia é que todas essas grandes empresas de tecnologia reconheceram que são parte fundamental de um ecossistema de combate à desinformação, haja vista que é por meio das redes sociais e dos aplicativos de mensagens que as mentiras e distorções da realidade mais circulam. A má notícia é que, na esmagadora maioria dos casos, as chamadas big techs têm falhado miseravelmente em cumprir a parte que lhes cabe nos acordos firmados com o TSE.

Pesquisadores do Instituto Nacional de Ciência & Tecnologia em Democracia Digital (INCT.DD), da Universidade Federal da Bahia, acompanham o cumprimento desses acordos. Em relatório divulgado há poucos dias, eles alertaram que as big techs já implementaram a maioria das ações acordadas com o TSE, mas, na prática, têm demorado demais para analisar conteúdos, processar denúncias e, assim, aumentar a transparência nas redes sociais para combater a desinformação. “O processo eleitoral é muito dinâmico e, desde o último pleito, o período de campanha oficial foi reduzido para dois meses”, disseram os pesquisadores Rodrigo Carreiro e Maria Paula Almada em seu relatório. Hoje, não há prazo definido para que as empresas de tecnologia analisem e removam, quando for o caso, uma postagem com conteúdo enganoso. O prazo ideal, segundo os pesquisadores, seria de 24 a 48 horas da publicação.

De fato, agilidade é um fator determinante para a eficácia de uma ação de combate à desinformação nas redes sociais, ambiente marcado pela velocidade de propagação de uma mensagem e por seu alcance, virtualmente ilimitado. Quanto mais tempo uma publicação de teor duvidoso permanecer no ar, maior será seu alcance. Consequentemente, qualquer ação de restauração da verdade dos fatos demandará muito mais esforço, e com menos chances de ser bem-sucedida.

O Estadão procurou todas as empresas que participaram das negociações com o TSE para questionar seus prazos para processar uma denúncia de conteúdo falso. Nenhuma delas respondeu. É importante destacar que não há uma lei que determine qual deveria ser o protocolo operacional dessas empresas. E nem haveria de ter. No entanto, foram essas mesmas empresas que, voluntariamente, aceitaram o oportuno convite do TSE e decidiram colaborar para tornar as redes sociais, hoje mídias incontornáveis, um ambiente mais sadio para o debate público. Para isso, assumiram compromissos que, até agora, não têm sido plenamente cumpridos. Não é pedir muito que elas façam o que disseram que fariam.

Os dois candidatos que lideram as intenções de voto para a Presidência da República, Lula da Silva (PT) e Jair Bolsonaro (PL), não são inocentes no que concerne à disseminação de mentiras nas redes sociais. Os petistas praticamente inventaram a máquina de destruição de reputações na internet, uma nódoa na atividade política no Brasil do século 21. Bolsonaro, por sua vez, elevou a má-fé à categoria de política de governo. De ambos, portanto, não se deve esperar bom comportamento no curso da atual campanha.