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Dez meses de convalescença

A economia cresceu até fevereiro, mas sem escapar do buraco do ano passado

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Por Notas & Informações
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O Brasil completou dez meses de crescimento econômico em fevereiro, prosseguindo na recuperação do primeiro grande impacto da pandemia, segundo o Banco Central (BC) e a Fundação Getúlio Vargas (FGV). Mas o País precisa continuar a escalada para sair do buraco onde caiu no grande tombo de março-abril do ano passado. Em 2020 o Produto Interno Bruto (PIB) foi 4,1% menor que em 2019. O grande quadro pouco mudou no primeiro bimestre de 2021, ainda marcado por muito desemprego, baixo poder de compra da maior parte das famílias e pouco vigor na indústria. Nos 12 meses até fevereiro, a produção de bens e serviços ainda foi 4% menor que no período encerrado um ano antes, de acordo com os cálculos das duas entidades. Esses números são vistos como prévias do PIB divulgado trimestralmente pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Com o governo enrolado em confusões e a equipe econômica tropeçando nos próprios pés, a recuperação prosseguiu nos primeiros meses deste ano sem ajuda federal. Suspenso em janeiro, o auxílio emergencial só voltou a ser pago – e em menor escala que em 2020 – a partir de abril. Sem Orçamento e sem planos, o poder central foi incapaz de proporcionar qualquer ajuda aos trabalhadores e às empresas. Enquanto isso, a pandemia se agravou, a mortandade cresceu e faltaram vagas em hospitais. A piora do quadro sanitário atrapalhou todo o esforço de reabertura dos negócios. Mas o Brasil se moveu, mesmo com muita dificuldade, apesar das condições adversas e do desgoverno.

Embora apontem a mesma tendência, os dois balanços são divergentes em alguns pontos. Segundo o Índice de Atividade Econômica do BC (IBC-Br), o País produziu em fevereiro 1,70% mais que no mês anterior e 0,98% mais que um ano antes. No primeiro bimestre o resultado foi 0,23% superior ao dos meses correspondentes de 2020. O Monitor do PIB-FGV mostra avanço de 1,40% na comparação de fevereiro com janeiro e de 1,60% no confronto com fevereiro do ano passado e recuo de 4% em 12 meses, coincidindo, nesse ponto, com o IBC-Br.

Embora “expressiva”, a taxa de crescimento mensal de 1,40% em fevereiro “não é motivo de euforia”, já que a comparação é com meses sob forte impacto da recessão, comentou o coordenador do estudo da FGV, Claudio Considera. Além disso, as comparações com os dados de fevereiro de 2020 têm como base uma economia já muito enfraquecida.

O crescimento de 1,40% em fevereiro foi puxado, segundo o Monitor, pela agropecuária (+ 1,90%) e pelos serviços (+ 1,70%), porque a produção industrial foi 0,40% menor que a de janeiro. Na área da indústria, só a extrativa mineral teve desempenho positivo, com ganho mensal de 1,50%. A indústria de transformação produziu 0,20% menos que no mês anterior e 1,90% mais que em fevereiro de 2020. Em 12 meses o conjunto da indústria acumulou queda de 3,50% e o segmento de transformação recuou 3,9%. O pior desempenho, nesse período, foi o da indústria da construção (-7,40%).

A fraqueza da indústria de transformação – onde se inclui a fabricação de bens de consumo, como roupas, eletrodomésticos e automóveis, assim como a produção de máquinas e equipamentos – é especialmente preocupante. Esse amplo conjunto começou a perder vigor antes da recessão de 2015-2016 e a recuperação deverá requerer muito investimento e muita reformulação política.

Segundo o Monitor, o PIB cresceu 2,90% no trimestre móvel até fevereiro, tomando-se como base os dados do trimestre findo em novembro. Pelas projeções do mercado, a economia deve avançar 3,04% neste ano e 2,34% no próximo. A expansão poderá basear-se, por algum tempo, na ocupação da capacidade ociosa. Mas um crescimento mais rápido e mais transformador dependerá de mudanças consideráveis no sistema produtivo e de muito investimento em máquinas, equipamentos e obras – e, em prazo mais longo, de melhoras na educação. Em 12 meses o investimento em capital fixo teve crescimento zero – sobre uma base já muito baixa. Esse é um bom ponto inicial para qualquer discussão séria sobre o futuro.