Imagem ex-librisOpinião do Estadão

Dinheiro curto para tantas promessas

Candidatos à Presidência da República ainda têm de explicar como arranjarão verbas para cumprir suas promessas e como ficarão as contas públicas com tantos gastos adicionais

Exclusivo para assinantes
Por Notas & Informações
2 min de leitura

Boas intenções podem ter efeitos desastrosos – para o Tesouro e para maioria dos brasileiros – quando o governo gasta sem planejar e sem respeitar os limites de suas contas. Este é o recado implícito na advertência de representantes do setor financeiro aos candidatos à Presidência da República. O recado inclui uma cifra: será perigoso ampliar a despesa além de R$ 70 bilhões, no próximo ano, para manter o Auxílio Brasil de R$ 600 e outros benefícios prometidos na campanha eleitoral. Essa despesa adicional será tolerável, esclarece a mensagem, até a definição de uma nova regra de controle fiscal. Uma nova regra será necessária se for abandonado o teto de gastos, formalmente ainda em vigor. O teto, estabelecido em 2016 por emenda à Constituição, limita o aumento da despesa à inflação do ano anterior.

A saúde das contas públicas é importante para todos, embora o assunto possa parecer distante e misterioso à maior parte das pessoas. A advertência aos candidatos partiu de representantes de bancos e de fundos de investimento. O setor financeiro reage com rapidez a sinais de insegurança nas contas oficiais, especialmente quando a dívida pública parece avançar em caminho perigoso.

Juros mais altos, custos maiores para o Tesouro e instabilidade cambial são alguns efeitos bem conhecidos. Dólar mais caro, mesmo quando há superávit no comércio exterior, pode ser consequência de algum desmando ou de alguma frase imprudente de uma alta autoridade. A criação desse tipo de incerteza tem sido uma das marcas da atuação presidencial de Jair Bolsonaro. O ministro da Economia, Paulo Guedes, levanta de vez em quando a bandeira da seriedade fiscal, mas acaba geralmente aceitando as pretensões de seu chefe e dos aliados do Centrão. Se tivesse agido de outra forma, talvez estivesse, há tempos, cuidando de alguma atividade fora do Ministério e, provavelmente, fora do Executivo federal.

Não é preciso ter especial familiaridade com os arcanos da política econômica para subscrever as advertências do setor financeiro aos candidatos. Afinal, não é difícil diferenciar a demagogia dispendiosa de programas sociais focados, eficientes e inclusivos. Os custos da irresponsabilidade fiscal são notórios, e as consequências da gastança populista, conhecidas: benefícios passageiros, seguidos de rombos fiscais, inflação, juros altos e dificuldades maiores para os mais pobres. Quanto maior e mais irresponsável a gastança, mais cedo termina a festa e maior é a conta passada aos convidados mais frágeis.

A inflação, um dos efeitos da gastança mal planejada e insustentável, é sempre mais dolorosa para os menos abonados. E é tanto mais dolorosa quanto maior o peso dos bens e serviços essenciais no desarranjo dos preços. Quando o dinheiro mal chega a cobrir os gastos com comida, transporte, gás de cozinha e energia elétrica, como tem ocorrido no Brasil, a miséria se agrava, espalha-se e cobra um preço altíssimo pela irresponsabilidade fiscal e pela má condução dos assuntos públicos.

Sem metas de crescimento econômico, sem estratégia de modernização, sem responsabilidade fiscal e sem efetivo programa de inclusão social, a gestão Bolsonaro criou com o Auxílio Brasil um arremedo de apoio aos pobres. Exigências mantidas por muitos anos, como a escolarização dos filhos e a vacinação, foram abandonadas. Nem houve surpresa. Ao desprezar esses critérios, o presidente da República estendeu a novas áreas a destruição das políticas de educação e saúde, uma das características mais notórias de seu mandato.

Dificilmente um candidato rejeitaria o compromisso de manter o aumento do Auxílio Brasil e, talvez, outros benefícios. Numa discussão honesta, seria preciso distinguir os verdadeiros pobres e os beneficiários selecionados como meros apoiadores do presidente Bolsonaro. Além disso, é necessário rever o Auxílio Brasil para torná-lo um programa de sustentação social merecedor desse rótulo. Enfim, ainda faltará compatibilizar esses gastos com a responsabilidade fiscal, condição de qualquer governo sério.