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Dólares continuam suficientes

Apesar dos erros do governo, agronegócio e mineração garantem segurança cambial

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Por Notas & Informações
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Com bons preços no mercado internacional, o agronegócio e a mineração continuam garantindo a segurança das contas externas do País, com a ajuda preciosa, é claro, do vigoroso mercado chinês, principal destino das exportações brasileiras. Com US$ 82,74 bilhões vendidos ao exterior, 24,93% mais que um ano antes, o Brasil fechou os primeiros quatro meses com superávit comercial de US$ 5,48 bilhões, 35% maior que o de janeiro a abril de 2020. Isso ajudou a reduzir o buraco nas transações correntes no quadrimestre de US$ 21,40 bilhões para US$ 9,72 bilhões, mantendo-o facilmente financiável com o investimento direto estrangeiro, segundo o Banco Central (BC). 

Quem nunca testemunhou uma crise cambial – balanço de pagamentos esburacado, dólar escasso e pressão de credores de fora – dificilmente poderá avaliar a importância econômica e principalmente social desse tipo de segurança. Mesmo sem risco próximo e com reservas de US$ 351 bilhões, mais que suficientes nas condições atuais, é preciso continuar cuidando, sem desleixo, da inserção do Brasil no sistema internacional.

Isso inclui relações civilizadas com todo o mercado, valorização das instâncias multilaterais, como a Organização Mundial do Comércio, e atenção a condições cada vez mais importantes para as decisões de negócios, como a preservação ambiental. Com frequência, o governo brasileiro tem violado essas normas de bom senso, expondo o País ao risco de restrições comerciais e financeiras. Em relação à China, graves erros diplomáticos criaram perigo para a saúde pública, afetando o ritmo de liberação de insumos para vacinas contra o coronavírus. Não pode haver dúvida quanto ao sentido político do atraso na liberação de ingredientes chineses prontos para embarque.

Apesar dos erros do governo, as exportações do agronegócio e da indústria mineral mantêm superavitário o comércio de bens, principal fonte de segurança cambial. Os outros itens das transações correntes continuam deficitários, embora com menor desequilíbrio que no ano passado. Na conta de serviços o buraco acumulado de janeiro a abril diminuiu de US$ 7,60 bilhões em 2020 para US$ 4,78 bilhões em 2021. Isso se explica em boa parte pela contração econômica e pelos cuidados sanitários, com déficits menores em transportes, seguros, viagens e aluguel de equipamentos. O mesmo efeito aparece na conta de rendas primárias, com forte redução, por exemplo, da remessa de ganhos com investimentos diretos (de US$ 13,52 bilhões para US$ 5,77 bilhões).

O investimento direto no primeiro quadrimestre, de US$ 21,40 bilhões, foi bem maior que o de janeiro a abril de 2020 (US$ 14,25 bilhões), mas este valor refletiu claramente o impacto inicial da pandemia nas decisões econômicas em todo o mundo. O investimento direto contabilizado em 12 meses, no valor de US$ 41,17 bilhões, continuou cobrindo com muita folga o déficit em transações correntes (US$ 12,39 bilhões). Pela primeira vez em seis meses esse valor superou a casa de US$ 39 bilhões.

Apesar disso, continuou muito abaixo do padrão dos últimos dez anos. Em julho do ano passado, o ingresso líquido desse tipo de aplicação ainda chegou a US$ 63,03 bilhões. Só a partir de agosto os valores ficaram abaixo de US$ 60 bilhões. Entre 2013 e 2019, os totais acumulados em 12 meses quase sempre superaram US$ 70 bilhões.

Investimentos diretos são aplicações de longo prazo, destinadas ao sistema empresarial. São recursos menos especulativos que aqueles aplicados no mercado de papéis e, portanto, especialmente relevantes para o crescimento. São também um indicador de como os investidores estrangeiros avaliam as possibilidades e perspectivas do País. Denotam, enfim, sua disposição de se associar ao processo econômico brasileiro, participando das oportunidades e riscos. O valor líquido recebido em abril, de US$ 3,54 bilhões, foi menor que os contabilizados em fevereiro e em março e inferior até ao registrado em julho de 2020 (US$ 3,95 bilhões). Convém esperar mais um pouco, no entanto, para uma avaliação de tendência.