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Improviso na educação

MEC não homologa resolução do CNE sobre aulas virtuais até 2021 e gera insegurança

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Por Notas & Informações
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Enquanto pais de alunos da cidade de São Paulo ameaçam – com base num manifesto já assinado por 8 mil pessoas – impetrar uma ação popular para pedir a retomada das aulas presenciais das escolas privadas e públicas ainda neste ano, o Ministério da Educação (MEC) até agora não homologou a decisão tomada há quase dois meses pelo Conselho Nacional de Educação (CNE) que permite a continuidade das aulas virtuais até dezembro de 2021. Esse prazo representa um ano a mais que o período de duração do decreto federal que estabeleceu o estado de calamidade pública por causa da pandemia.

Esses dois fatos dão a medida de como a educação brasileira vem sendo gerida de modo improvisado em todos os seus níveis. Como o presidente Jair Bolsonaro é a favor do ensino presencial, apesar de não ter conhecimento técnico na área, o titular do MEC, ministro Milton Ribeiro, eximiu-se de referendar a decisão do mais importante órgão colegiado do setor educacional brasileiro. O CNE tem autonomia para definir as linhas programáticas referentes à educação. Suas decisões, contudo, precisam ser homologadas pelo ministro. O detalhe é que os dois representantes do MEC votaram em favor da prorrogação do ensino virtual por mais um ano, colidindo assim com a posição do Palácio do Planalto. 

A resolução do CNE foi aplaudida pelos secretários estaduais e municipais de Educação de todo o País, uma vez que procura dar conta das diferentes dificuldades enfrentadas pelo ensino fundamental, médio e superior em todo o País. Ela também ampliou o alcance de casos excepcionais de atendimento educacional por causa da covid-19. E ainda acolheu reivindicações feitas por instituições particulares de ensino básico e superior. No ensino básico, por exemplo, ela propõe a integração dos currículos de 2020 e 2021. E recomenda que o retorno às aulas presenciais – que estão suspensas desde março – só seja autorizado se estiver amparado em protocolos das autoridades locais, com regras de escalonamento nas escolas.

No entanto, caso a resolução não seja homologada, por causa da queda de braço entre o CNE, de um lado, e um Ministério da Educação entregue aos caprichos do presidente Jair Bolsonaro, de outro, os Estados e os municípios não poderão, como está ocorrendo excepcionalmente em 2020, computar em 2021 as atividades remotas como parte da carga horária obrigatória de aulas.

Além disso, como o impasse deixa as escolas públicas e particulares sem diretrizes oficiais, a insegurança jurídica pode levar à judicialização da resolução do CNE e da omissão do MEC, seja por iniciativa do Ministério Público, seja por meio de ações populares. Em decorrência do impasse, os conselhos estaduais e municipais de Educação também não terão como fundamentar suas resoluções locais com base numa resolução nacional, como é comum numa Federação.

Na última quinta-feira, ao lado de Bolsonaro, o ministro da Educação afirmou que a responsabilidade pelo retorno das aulas presenciais está a critério de cada rede de ensino. Mas, na ausência de diretrizes federais, quaisquer que sejam as decisões que as redes e as escolas vierem a tomar, elas poderão ser questionadas nos tribunais.

Além de não homologar a resolução do CNE sem oferecer explicações técnicas, o ministro da Educação, que está no cargo há quatro meses e meio, vem primando pela lentidão administrativa num período de grave crise de saúde pública. Só em outubro, depois de quase nove meses de fechamento das escolas, o MEC anunciou uma linha de financiamento relacionada à pandemia. 

No mundo inteiro, os impactos da covid são o maior desafio para os dirigentes educacionais já surgido nas últimas décadas, exigindo capacidade de articulação dos governos centrais com os governos regionais e locais. Pela inépcia do MEC e por tudo o mais que o governo Bolsonaro vem mostrando no setor, o Brasil está infelizmente sendo derrotado nessa empreitada, prejudicando com isso, de modo irrecuperável, a formação das novas gerações.