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Ineficiência e injustiça

Estrutura rigorosa imposta pela legislação gera grande ineficiência na destinação dos recursos

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Por Notas e Informações
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Dos muitos dados que mostram o mau uso que o Estado brasileiro faz do dinheiro arrecadado dos contribuintes, um em particular se destaca: mais de 75% das transferências de recursos públicos se destinam não à parcela mais necessitada da população, como deveria ser, mas às camadas de renda mais alta. “As transferências, que incluem aposentadorias contributivas e subsídios, beneficiam principalmente quem tem renda maior, enquanto aposentadorias não contributivas e transferências condicionadas, que alcançam a população mais pobre, respondem por menos de 25% do montante”, concluiu o estudo Melhores Gastos para Melhores Vidas feito pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) a respeito da utilização dos recursos públicos no Brasil. Como resumiu o secretário do Tesouro Nacional, Mansueto Almeida, o gasto público reduz muito pouco a desigualdade no Brasil.

Este é um dos muitos problemas identificados na estrutura de despesas do setor público. Essa estrutura rigorosa imposta pela legislação gera grande ineficiência na destinação dos recursos, engessa programas e projetos, especialmente os destinados a investimentos na ampliação dos serviços prestados à população, e onera cada vez mais o contribuinte.

São muitos os exemplos apontados pelo estudo do BID que mostram a ineficiência dos gastos públicos, sobretudo quando se leva em conta a necessidade de preparar o País para um futuro melhor, com crescimento econômico e redução das grandes desigualdades sociais que ainda persistem.

É especialmente preocupante o fato de que, por ineficiência, os gastos públicos acabam não conduzindo “à equidade que leva à igualdade de oportunidades”, diz o estudo. Desperdiça-se dinheiro público para a perpetuação de um quadro socialmente injusto. 

Uma das despesas ineficientes e que mais oneram o setor público é com a previdência. O gasto com aposentadorias e pensões no Brasil é, proporcionalmente ao Produto Interno Bruto (PIB), o mais alto da América Latina e Caribe – e vem crescendo. Por isso sobra cada vez menos dinheiro para outras atividades do governo. Mantidos os níveis atuais de gastos, chegar-se-ia ao absurdo de o sistema previdenciário exigir 138% do orçamento público para se sustentar (hoje já representa 40% do orçamento). Nessa situação, nem mesmo cortando totalmente as demais despesas e suspendendo todos os serviços públicos o Estado conseguiria pagar os benefícios previdenciários.

Quanto às novas gerações, o regime previdenciário atual é especialmente cruel. Gasta-se hoje sete vez mais de dinheiro público com a população mais velha do que com os jovens. Não é que não se deva dar a devida atenção aos idosos, mas é necessário rever o tratamento dispensado aos mais novos, pois uma alocação ineficiente de recursos públicos pode comprometer o futuro.

Outro gasto que o estudo do BID considera ineficiente é o relativo aos salários e outros benefícios do funcionalismo público. Essas despesas representam cerca de 8% do PIB, o que não é um índice excessivo se comparado com o observado em outros países da região. Mas elas são consideradas ineficientes porque asseguram aos servidores salários 60% mais altos do que os pagos em média no setor privado.

Alguns números do estudo do BID podem surpreender, mas seus diagnósticos não são inteiramente novos. Como observou o secretário do Tesouro, nos últimos anos 90% do crescimento das despesas primárias – que não incluem o custo da dívida pública – decorreu do aumento dos gastos com programas de transferência de renda, especialmente a Previdência Social. Nem com o aumento expressivo do valor dessas transferências, porém, se conseguiu reduzir a desigualdade social no País.

Para caber no orçamento público, os gastos com transferências acabaram comprimindo outras despesas, especialmente os investimentos públicos, que vêm caindo há anos. Sem modificar as regras da Previdência e sem outras reformas, a situação só piorará.