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Inferno no Caribe

Um ano depois, as agruras que levaram os cubanos às ruas só se agravaram – e a truculência do regime também

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Por Notas & Informações
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Em julho de 2021, milhares de cubanos foram às ruas protestar contra as dificuldades econômicas e a falta de liberdade. A maior mobilização popular desde o início do regime, em 1959, foi pacífica e espontânea, mas a reação do governo foi tudo menos isso. Valendo-se de um aparato incrementado ao longo de décadas, ele asfixiou brutalmente a dissidência. Um ano depois, enquanto a economia e os serviços públicos se deterioraram, o governo ampliou a repressão. Aos descontentes, como diz o título de um relatório da Human Rights Watch, resta A Prisão ou o Exílio.

Na pandemia, o governo apostou em vacinas domésticas ineficazes, e o sistema de saúde, desprovido de medicamentos e equipamentos, foi sobrecarregado. A economia ainda está 11% menor do que em 2018. Oficialmente a inflação em 2021 foi de 70%, mas a Economist Intelligence Unit estima que bateu quase 300%.

Os registros de violações a direitos humanos, incluindo intimidações a familiares, detenções arbitrárias, processos viciados e tortura indicam uma concertação para obliterar novos protestos. Após os apagões da internet – cujo acesso foi concedido só em 2018 –, diversas organizações reportaram uma conectividade errática e restrições às redes sociais. Os tribunais condenaram mais de 380 manifestantes e testemunhas, incluindo diversos menores.

Críticos que não foram detidos foram proibidos de deixar suas casas por dias ou semanas. Mais de mil pessoas foram presas e centenas continuam detidas. Muitas ficaram incomunicáveis por semanas ou meses. Diversos julgamentos foram realizados por cortes marciais. As sentenças desproporcionais chegam a décadas de prisão por atos como insultar o presidente ou a polícia, ou cantar “pátria ou vida” – uma referência irônica à divisa castrista “pátria ou morte”.

O governo decretou dezenas de normas penais tão draconianas quanto vagas, criminalizando conteúdos “ofensivos” que “perturbem a ordem pública” ou “insultem” funcionários de alto escalão.

Milhares fugiram do país, num êxodo possivelmente sem precedentes. Só nos EUA, por exemplo, foram detidos 118 mil cubanos – um aumento dramático em relação aos 17 mil no mesmo período em 2021.

A incapacidade da comunidade internacional de implementar mecanismos de pressão multilateral eficientes só agrava esses horrores. Muitos governos latino-americanos, como México e Argentina, relutam em criticar o regime.

A perspectiva tende a piorar se Lula da Silva, um entusiasmado simpatizante da ditadura cubana, confirmar seu favoritismo e se eleger presidente do Brasil. Recorde-se que Lula relativizou as manifestações de cubanos, dizendo que também nos Estados Unidos e em países europeus há protestos – como se fossem a mesma coisa. Mas o cinismo não parou por aí: o demiurgo de Garanhuns ainda festejou o fato de que “graças a Deus existe a possibilidade de haver manifestação” em Cuba – uma mentira evidente, fartamente documentada pela Human Rights Watch.

Em democracias, protestos em massa pressionam os governos a buscar mudanças ou enfrentar a queda. Nas ditaduras eles servem de pretexto para ossificar o regime e galvanizar a repressão. O Partido Comunista cubano seguiu esse roteiro à risca.