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Irresponsabilidade capixaba

Anistia a PMs grevistas é prêmio a quem colocou a segurança da população em risco

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Por Notas & Informações
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Convocada durante o recesso parlamentar, a Assembleia Legislativa do Espírito Santo (Ales) aprovou por unanimidade o projeto de lei apresentado pelo novo governador, Renato Casagrande (PSB), concedendo anistia das penalidades e procedimentos administrativos impostos a policiais militares em razão da greve de 2017. É uma medida irresponsável premiar um movimento ilegal que, na tentativa de obter ganhos políticos e salariais, colocou em risco a segurança da população capixaba.

Iniciada em 3 de fevereiro de 2017, a paralisação contou com a colaboração de mães, esposas e irmãs dos policiais, que bloquearam quartéis da Polícia Militar em Vitória e em cidades do interior do Estado. O motim terminou no dia 25 de fevereiro, deixando um rastro de violência e criminalidade. No período da greve, sem policiamento das ruas, houve inúmeros saques a estabelecimentos comerciais e mais de 200 pessoas foram assassinadas.

Diante de tamanha afronta à lei, a corregedoria da Polícia Militar abriu 2,6 mil processos administrativos contra os grevistas. Foram expulsos 23 policiais militares e 90 profissionais estão em processo de demissão. Com a aprovação da lei, todos os processos administrativos disciplinares de rito ordinário e de rito sumário serão arquivados, bem como os conselhos de Justificação e de Disciplina relativos à greve.

A lei agora aprovada também prevê que os militares que retornarem às suas corporações terão todos os direitos relativos ao período de afastamento. Ou seja, além da anistia por uma greve ilegal que deixou o Estado numa situação caótica, os militares envolvidos na paralisação receberão todos os salários do período em que estiveram afastados de suas funções. De acordo com a proposta do Executivo, o retorno dos militares terá um impacto orçamentário de R$ 1,86 milhão, sendo R$ 839 mil referentes ao pagamento retroativo de salários.

Durante a sessão extraordinária na Ales, o deputado Enivaldo dos Anjos (PSD) apresentou uma emenda ao projeto, para que as famílias das vítimas e os comerciantes saqueados durante a greve da polícia fossem indenizados pelo Estado. A ideia foi rejeitada.

A anistia dos militares grevistas era uma promessa de campanha de Renato Casagrande. Segundo o governador, a medida teria por objetivo “fechar uma ferida de um mês triste para a história da segurança pública capixaba”. No entanto, o que a anistia faz é o oposto, já que provê todas as condições para que a ilegal paralisação dos policiais volte a ocorrer. Deixar impune esse tipo de motim é uma grave irresponsabilidade com toda a população e um péssimo exemplo para uma corporação que já mostrou até onde pode ir sua indisciplina.

“É uma decisão contra a lei, que proíbe greve de funcionário público armado. E também é uma decisão contra a sociedade, que ficou refém durante o movimento grevista e que viu vidas serem perdidas em função da greve”, lembrou Paulo Hartung, governador do Estado na época da greve.

Menos de um mês depois da paralisação, o Supremo Tribunal Federal (STF) reafirmou o entendimento de que os servidores que atuam na área de segurança pública não podem entrar em greve, já que desempenham atividade essencial à manutenção da ordem pública. Com repercussão geral reconhecida, a decisão do Supremo vincula todas as outras instâncias do Judiciário.

Ao conceder a anistia, o Estado do Espírito Santo premiou também a chantagem de setores do funcionalismo contra a responsabilidade fiscal. Acusado de “não dialogar” com os grevistas, Paulo Hartung lembrou que, em 2017, “não havia dinheiro para conceder reajuste salarial naquele momento porque, quando assumi o Estado, ele já se encontrava no limite de alerta em relação ao gasto de pessoal, o que fere a Lei de Responsabilidade Fiscal”.

É triste que o Executivo e o Legislativo do Estado do Espírito Santo tenham se unido para tamanha irresponsabilidade, assegurando impunidade para quem agiu contra a lei. Os grevistas foram preservados das consequências de seus atos – quem assume a conta e o risco é, uma vez mais, a população.