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Magistrados denunciados

Enquanto as corregedorias das Justiças estaduais não cumprirem seu papel, só órgãos com jurisdição nacional podem coibir o corporativismo da magistratura e afastar juízes e desembargadores indignos da toga

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Por Notas & Informações
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A imagem do Poder Judiciário foi afetada novamente por um caso de corrupção de magistrados. Desta vez o problema ocorreu no Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA) e envolve dois juízes e quatro desembargadores, entre eles o presidente da Corte. Todos foram afastados do cargo por três meses, por suspeita de envolvimento em um esquema de venda de decisões judiciais e grilagem em disputa de terras em uma área de mais de 300 mil hectares na região oeste do Estado. O esquema é integrado não apenas por esses magistrados, mas igualmente por servidores e assessores do TJ-BA, em conluio com produtores rurais.

Determinado pelo ministro Og Fernandes, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), o afastamento foi pedido pela Procuradoria-Geral da República. No plano administrativo, o caso está sendo investigado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que há oito meses suspendeu uma portaria do TJ-BA que tratava de matrícula de terras. O órgão também está investigando decisões conflitantes da Corte, ora autorizando ora cancelando autorizações de reintegração de posse na região oeste do Estado da Bahia.

Além de autorizar a Polícia Federal (PF) a cumprir 40 mandados de busca e apreensão em quatro cidades baianas e em Brasília, mobilizando 200 agentes, o ministro autorizou quatro prisões de pessoas ligadas ao esquema. Também determinou a indisponibilidade dos bens dos seis magistrados, no valor total de R$ 581 milhões. E ainda os proibiu de ingressar nas dependências da Corte, de usar seus serviços e de se comunicar com assessores e funcionários.

A decisão de Fernandes foi tomada para evitar que, usando suas prerrogativas, os juízes e desembargadores obstruíssem investigações e repassassem para terceiros ativos oriundos da atividade criminosa. Mais do que tentar resguardar a imagem da Justiça baiana, o afastamento do cargo e a indisponibilidade dos bens foram feitos com o objetivo de mostrar à população que seus processos judiciais não serão julgados por magistrados suspeitos de crimes, afirmou o ministro.

Diante da imagem negativa que as diferentes instâncias e braços especializados do Poder Judiciário têm perante a sociedade, a justificativa de Fernandes não podia ser mais sensata e oportuna. Entre outros motivos, porque as acusações contra os seis magistrados são graves e esse não é o primeiro caso de corrupção no TJ-BA. Em 2013, a Corregedoria Nacional de Justiça, vinculada ao CNJ, acusou alguns desembargadores - inclusive um ex-presidente da Corte - de participar de um esquema criminoso montado para superfaturar os valores de precatórios, mediante a utilização de índices de correção monetária indevidos. Num dos casos, um precatório de R$ 3 milhões teria sido recalculado em R$ 290 milhões. Em outro caso, os auditores da Corregedoria constataram que a diferença entre o que foi efetivamente pago e o que era de fato devido foi superior a R$ 448 milhões. Na época, o presidente do CNJ, ministro Joaquim Barbosa, criticou o corporativismo das corregedorias das Justiças estaduais e lembrou de casos em que alguns precatórios foram recalculados em menos de 24 horas.

Esse corporativismo pode ser visto na reação do TJ-BA com relação às decisões do ministro Og Fernandes. Em nota, a direção da Corte alegou ter sido “surpreendida com a ação da Polícia Federal” e os acusados não puderam se defender, o que fere os direitos humanos e fundamentais. Além disso, como o afastamento dos seis magistrados se deu às vésperas da eleição do novo presidente da Corte, uma desembargadora afastada alegou que a operação da PF e a decisão do ministro do STJ tiveram objetivos políticos, impedindo quatro eleitores de votar, o que alterará o resultado do pleito. Esse argumento, obviamente, não pode ser levado a sério. Os fatos deixam claro que, enquanto as corregedorias das Justiças estaduais não cumprirem seu papel, só órgãos com jurisdição nacional, como o CNJ e o STJ, podem coibir o corporativismo da magistratura e afastar juízes e desembargadores indignos da toga.