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Marcha reduzida na indústria

Produção industrial perdeu impulso e sustentação em 2021 é uma questão aberta

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Por Notas & Informações
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Turbinada por medidas emergenciais, a indústria saiu do buraco e produziu em outubro 1,4% mais que em fevereiro, último mês antes do grande choque. A produção cresceu 39% ao longo de seis meses de avanço contínuo. Essa taxa foi mais que suficiente para compensar a perda de 27,1% acumulada em março e abril, quando o volume produzido chegou ao nível mais baixo da série. Mas o impulso de recuperação diminui, enquanto o desemprego segue muito alto, as famílias perdem renda e o governo continua sem explicar como será o Orçamento de 2021.

O crescimento mensal da indústria ficou em 1,1% em outubro, com a taxa recuando pelo quarto mês consecutivo, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A produção havia aumentado 8,7% em maio, 9,6% em junho, 8,6% em julho, 3,4% em agosto e 2,8% em setembro. Além disso, a expansão foi bem menos disseminada. Em setembro, 22 dos 26 ramos pesquisados haviam produzido mais que no mês anterior. Em outubro, só 15 apresentaram crescimento.

A maior expansão, 4,7%, ocorreu na indústria de autoveículos, carrocerias e reboques, brutalmente afetada no primeiro impacto da pandemia. Depois de crescer 1.075,8% em seis meses, a produção do setor ainda ficou 9,1% abaixo do nível de fevereiro.

Com o crescimento de outubro, a produção da indústria superou por 0,3% a de um ano antes, mas o desempenho de janeiro a outubro foi 6,3% inferior ao de igual período de 2019. Em 12 meses o total produzido foi 5,6% menor que o do período imediatamente anterior.

Uma perspectiva mais ampla facilita uma visão mais clara da crise industrial. O setor entrou mal em 2020 e a pandemia agravou um quadro já muito ruim. Tendo conseguido sair do buraco de março-abril, a indústria ainda tem de enfrentar uma longa recuperação.

Com o último resultado, a produção da indústria geral ainda foi 14,9% inferior à do pico alcançado em maio de 2011. A partir daí, com algumas oscilações, a tendência básica foi de queda. A recessão de 2015-2016 foi um capítulo especialmente dramático e a recuperação a partir de 2017 nunca foi completa. A melhora acumulada até 2018 já se perdeu em 2019, no primeiro ano de mandato do presidente Jair Bolsonaro.

De novembro do ano passado a fevereiro deste ano a indústria acumulou quatro meses de produção menor que a de um ano antes. Em março a atividade foi afetada pela pandemia. Isso alongou até agosto a sequência de meses com desempenho inferior ao do ano anterior – uma série de dez, entre novembro de 2019 e agosto de 2020. Em setembro a comparação interanual indicou uma melhora de 3,7%, reduzida em outubro para 0,3%.

A notícia mais positiva é a confiança exibida, segundo a Confederação Nacional da Indústria, por dirigentes dos 30 setores industriais analisados. Essa confiança, de acordo com a pesquisa, cresceu ligeiramente em novembro. Em um mês o índice geral passou de 61,8 pontos para 62,9. Os indicadores acima de 50 são positivos.

A confiança empresarial é um insumo importante para a atividade, mas falta saber de onde virá demanda suficiente para sustentar o consumo e a produção industrial. Em setembro havia 13,5 milhões de desempregados, segundo o IBGE. As contratações de fim de ano geram basicamente empregos sazonais. Além disso, nem um fim de ano muito mais animado poderia reduzir substancialmente a desocupação.

O auxílio emergencial, diminuído de R$ 600 para R$ 300 por mês a partir de setembro, deve terminar em dezembro. Pelo menos até agora essa é a perspectiva. Outro fator de complicação é o maior endividamento das famílias, apontado em pesquisa recente.

Segundo o Ministério da Economia, o consumo poderá ser parcialmente sustentado, em 2021, com a poupança acumulada por famílias de renda média e média alta na fase de distanciamento. Além disso, de acordo com a mesma previsão, mais pessoas estarão empregadas – embora falte dizer de onde virá emprego suficiente para estimular o gasto familiar. Talvez o governo tenha uma resposta quando descobrir, enfim, como será seu próximo Orçamento.