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Necessária proteção dos superendividados

Falta de definição do ‘mínimo existencial’ ainda limita a plena aplicação da Lei do Superendividamento, em vigor desde julho

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Por Notas & Informações
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Destinada a prevenir o endividamento excessivo dos consumidores e a facilitar as negociações entre devedor e credor, a Lei do Superendividamento (Lei n.º 14.181/21) está em vigor desde o dia 2 de julho de 2021 e foi saudada como grande avanço na proteção financeira das pessoas, especialmente as de renda mais baixa. Mas sua efetiva aplicação ainda depende de uma regulamentação que contenha definições essenciais. Sem elas, a Justiça e alguns Procons têm tomado decisões nem sempre coincidentes, o que vem gerando insegurança nas relações entre devedores e credores. Cabe ao Poder Executivo regulamentar a questão, o que precisa ser feito com presteza, dadas as dificuldades enfrentadas por milhões de famílias brasileiras.

Instituições de defesa do consumidor apontam que há cerca de 30 milhões de pessoas com dívidas tomadas em boa-fé e cuja amortização está além de sua possibilidade financeira de quitá-las “sem comprometer seu mínimo existencial”, como estabelece a lei. Números como esses mostram a importância e o alcance da lei. Mas entre as definições que se esperam com a regulamentação está justamente a de “mínimo existencial”. O Ministério da Justiça realizou consulta pública sobre o tema, mas ainda não anunciou sua decisão.

A definição estabelecerá quanto cada devedor preservará de sua renda para cobrir as despesas “mínimas” e quanto poderá utilizar para quitar a dívida – ou, visto pelo lado do credor, quanto as instituições financeiras poderão exigir do devedor para a quitação do compromisso.

O tema é complexo. Se for uma porcentagem da renda, ela poderá ser baixa para quem tenha renda mais alta, mas excessiva para os mais pobres. Boa parte dos devedores, além disso, deve pertencer à categoria dos trabalhadores informais, que representam cerca de 40% da população ocupada. Além de marcada pelas incertezas quanto à continuidade de seu recebimento, como é comum nessa faixa do mercado de trabalho, há também dúvidas sobre o valor regular da renda dos informais. Se for um valor fixo, uma das possibilidades em estudo pelo governo, pode ser inadequado, excessivo ou insuficiente, dependendo da renda do devedor.

Há grande diferença entre decisões que a Justiça tem tomado em todo o País para a fixação do “mínimo essencial”. Elas variam de 30% a 60% da renda informada pelo devedor.

A despeito de ainda necessitar de regulamentação, a Lei do Superendividamento é um avanço na proteção dos consumidores. Embora ao sancioná-la o presidente Jair Bolsonaro tenha vetado alguns dispositivos aprovados pelo Congresso – como a proibição de a publicidade utilizar expressões como “sem juros” e a fixação do limite de 30% da renda mensal para o pagamento de dívidas –, a lei fixa o prazo de cinco anos para a quitação da dívida. Também abre o direito de eles negociarem com todos os credores ao mesmo tempo. Cria-se, assim, uma espécie de recuperação judicial do devedor individual. A intenção é assegurar um acordo mais justo. A plena vigência da lei, por isso, é vital para muitas famílias.