Imagem ex-librisOpinião do Estadão

No caso dos Correios, o padrão do governo

Sem liderança e sem interesse do governo, projeto de privatização está parado; é mais uma promessa que não sai do papel

Exclusivo para assinantes
Por Notas & Informações
Atualização:
2 min de leitura

A tramitação do projeto de lei de privatização dos Correios, atualmente no Senado, é um retrato perfeito do descompasso entre discurso e ação do governo do presidente Jair Bolsonaro e, em especial, de sua incompetência em praticamente todas as frentes em que precisa atuar. A aprovação do projeto já foi tema urgente; hoje, é assunto praticamente esquecido. Nessa e em outras questões que demandam decisões e trabalho do governo, faltam estudos adequados, falta empenho do presidente – que, quando deputado federal por 27 anos, sempre se mostrou contrário à venda de estatais –, falta articulação política quando esta é indispensável. Nada disso surpreende, pois este é o padrão do governo Bolsonaro – o que ocorre com a privatização dos Correios já foi ou está sendo visto em outras áreas de atuação do governo federal.

A privatização da estatal era tratada pelo governo como símbolo, pois seria a primeira de uma série de ações com as quais, desde a campanha eleitoral de 2018, Bolsonaro e sua equipe diziam ser possível arrecadar até R$ 1 trilhão. Era dinheiro para resolver definitivamente a crise fiscal. A venda de estatais era a face mais brilhante do que o atual ministro da Economia, Paulo Guedes, dizia ser seu plano de governo. Houve quem acreditasse. Em três anos e três meses, no entanto, a atual gestão criou duas estatais e, até agora, só conseguiu transferir uma (a Companhia Docas do Espírito Santo) para o controle privado.

O projeto de privatização dos Correios foi aprovado em regime de urgência pela Câmara dos Deputados. Parecia que avançaria com rapidez também no Senado, abrindo caminho legal para a venda da empresa para o setor privado. Mas a desarticulação do governo na defesa de projetos de seu interesse no Congresso – dominado pelo Centrão, com a concordância submissa do Executivo – resultou na paralisação do processo no Senado.

Desde dezembro, quando Fernando Bezerra Coelho (MDP-PE) deixou o cargo por ter perdido a eleição para a indicação do Senado ao Tribunal de Contas da União, o governo estava sem líder no Senado. O relator indicado para o projeto dos Correios, Márcio Bittar (União Brasil-AC), chegou a apresentar um relatório pela aprovação do texto anteriormente votado pela Câmara. Enfrentou resistências. Para superá-las, alterou o relatório, mas nem assim conseguiu que o texto fosse votado pela Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado. Isolado, devolveu a relatoria e até agora o presidente da CAE, Otto Alencar (PSD-BA), não escolheu o substituto.

Os prazos previstos pelo governo estão sendo vencidos. Depois da aprovação do projeto pela Câmara, previa-se a aprovação pelo Senado no início de setembro do ano passado. Se isso tivesse ocorrido, o leilão de privatização poderia ser realizado até este mês. Sete meses depois, nada avançou no Senado. Se houver andamento rápido a partir de agora, é possível que haja tempo para a realização do leilão no segundo semestre. Mas haverá condições políticas para isso no período que será fortemente marcado pela campanha eleitoral?