Imagem ex-librisOpinião do Estadão

No meio do susto, um governo tranquilo

Risco do vírus afeta mercados e apostas econômicas, mas não abala o Executivo

Exclusivo para assinantes
Por Notas & Informações
2 min de leitura

O Brasil estaria bem melhor, se um governo feliz, confiante na economia e satisfeito com o crescimento de 1,1% em 2019 pudesse dinamizar o País. Mas a semana terminou com dólar ainda muito alto, mercado financeiro inquieto e muita insegurança quanto aos efeitos do coronavírus. Embora tentando exibir tranquilidade, o presidente da associação das montadoras de veículos, Luiz Carlos Moraes, lembrou o exemplo de outros países, onde medidas preventivas têm sido tomadas, e acabou num quase desabafo: “Ainda é cedo para falar em impactos do coronavírus no Brasil, mas não é melhor fazer algo para a bicicleta continuar andando em vez de esperá-la parar?”.

A pergunta foi feita na manhã de ontem, num encontro para apresentação dos últimos números do setor. A produção de veículos no primeiro bimestre foi 13,4% menor que a de um ano antes, fato explicável pelo menos em parte pelo carnaval, mas o dinamismo do setor, mesmo com alguma recuperação, continua longe daquele registrado antes da crise de 2015-16.

De janeiro a dezembro do ano passado as montadoras fabricaram 2,94 milhões de veículos montados. Em 2013, foram produzidos 3,71 milhões. Em 2014, já com a economia escorregando para a recessão, 3,15 milhões saíram das linhas de montagem. A lenta reação do setor automobilístico e de outros segmentos da indústria é um dos principais sintomas de uma economia ainda em marcha muito lenta e agora ameaçada, embora o governo menospreze esse risco, pelos efeitos de uma nova epidemia de dimensões globais.

Os sinais de medo se manifestam mais prontamente nas variações diárias dos mercados financeiros e, de modo especial, na evolução do câmbio. No começo da tarde de sexta-feira o Ibovespa, índice principal da bolsa brasileira, assinalava uma baixa de 4,08%, marcando 98.057,51 pontos. Foi um enorme tombo desde o nível máximo alcançado em 23 de janeiro, quando o indicador chegou a 119.527,63 pontos. Apesar do pífio desempenho da economia em 2019, a bolsa de valores vinha refletindo apostas numa recuperação mais firme da atividade, além, é claro, da reorientação de recursos durante muito tempo aplicados em papéis de renda fixa.

Aquele otimismo se evaporou na bolsa brasileira, assim como nos mercados de capitais dos centros financeiros mais importantes do mundo. Naquele começo de tarde, os mercados de capitais já haviam despencado, de novo, em grandes bolsas europeias.

Enquanto as ações caíam rapidamente, o dólar se mantinha nas alturas. Mesmo com pequeno recuo depois de 12 sessões de alta, a moeda americana ainda era cotada a R$ 4,646, depois de oscilar entre a mínima de R$ 4,612 e a máxima de R$ 4,671.

Pouco antes, o mercado havia conhecido as novas projeções da Moody’s, uma das principais agências internacionais de avaliação de risco de crédito. Segundo a agência, a epidemia do coronavírus ainda prejudicará a economia de muitos países no segundo trimestre. Mas o comunicado ainda trouxe uma ressalva: a normalização das atividades vai depender de um fator indeterminado neste momento, o tempo necessário para conter a disseminação global do vírus. A Moody’s cortou de 2,4% para 2,1% a expansão econômica projetada para o Grupo dos 20 (G-20), formado pelas maiores economias do mundo. Houve cortes de 5,4% para 4,8% no caso da China, de 1,7% para 1,5% no dos Estados Unidos e de 2% para 1,8% no do Brasil.

A boa notícia da semana veio da China, onde a expansão da doença tem sido mais lenta e a atividade se recupera em alguns centros. Mas o vírus continua a espalhar-se em outras áreas, incluído o Brasil. Medidas econômicas preventivas têm sido anunciadas em vários países. No Brasil, a expectativa é de novo corte de juros, com as apostas entre 0,25 e 0,50 ponto porcentual. Mas isso é assunto do Banco Central. No Executivo, até sexta-feira, os sinais de preocupação com a economia eram raridade.