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No radar, inflação, juros e atoleiro

Contra a inflação, aperto monetário pode ser maior, admite diretor do BC, e isso reforça a expectativa de mais estagnação

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Por Notas&Informações
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Com a inflação desatada, cresce o perigo de maiores aumentos de juros e, portanto, de maiores entraves à expansão dos negócios e do emprego. Uma nova alta da taxa básica de juros está prevista para o começo de dezembro, na próxima reunião do Copom, o Comitê de Política Monetária do Banco Central (BC). A expectativa, por enquanto, é de mais uma elevação de 1,5 ponto porcentual, como foi indicado pelo comitê depois do último ajuste. Mas a subida poderá ser maior, se isso for necessário, disse o diretor de Política Monetária do BC, Bruno Serra, numa entrevista ao jornal japonês Nikkei Asia. Preocupante para empresários e consumidores, seria bom se esse recado fosse levado muito a sério pela cúpula do Poder Executivo, fonte importante de incerteza econômica, de tensão cambial e de instabilidade de preços.

“Nós ainda estamos perseguindo o centro da meta de 2022”, declarou o diretor, segundo o jornal. Com isso ele reafirmou, um tom acima, o compromisso do presidente do BC, Roberto Campos Neto, de levar a alta de preços ao centro do alvo no próximo ano. Apesar desse compromisso, têm piorado continuamente as previsões dos economistas do setor financeiro e das grandes consultorias. Enquanto isso, o presidente da República se empenha na busca de votos e converte o Orçamento em pizza repartida entre os aliados do Centrão.

Um aumento de gastos só deveria ocorrer, segundo declaração atribuída pelo Nikkei Asia ao diretor Bruno Serra, com redução de outras despesas. De acordo com a reportagem, ele comentou, ao falar da inflação, os questionamentos, no mercado, sobre a estabilidade do arcabouço de teto de gastos, “que funcionou muito bem” desde sua criação.

Esses questionamentos afetam negativamente as expectativas na área financeira. Segundo a mediana das projeções divulgadas na última segunda-feira, com a pesquisa Focus, do BC, a inflação deve chegar neste ano a 9,33%, ultrapassando com folga o limite de tolerância, de 5,25%. A meta de 2021, quase esquecida, é de 3,75%. Em 2022, de acordo com a pesquisa, os preços ao consumidor devem subir 4,63%, longe da meta central de 3,50% e já perto do limite de 5%. Dias depois, conhecida a inflação de outubro, de 1,25%, a mediana das avaliações coletadas pela Agência Estado apontou inflação de 4,80% no próximo ano.

Se o Copom confirmar, na próxima reunião, a hipótese de um aumento maior que 1,5 ponto, a taxa básica no fim do ano ficará acima dos 9,25% previstos até há pouco. Os juros de 11% esperados para o fim de 2022 também serão superados e já se fala, no mercado, em 11,38%. Além de atrapalhar os negócios e dificultar o investimento em máquinas, equipamentos e obras, dinheiro mais caro elevará os custos do Tesouro e poderá aumentar o endividamento público. Sem novidades para contrabalançar, o peso da dívida afetará as expectativas no setor financeiro, realimentando problemas na área fiscal e reduzindo as possibilidades de ação do setor público. Continuam fartamente justificadas as previsões de um péssimo legado para quem assumir a Presidência em 2023.

Mesmo sem aumento de juros maior que o previsto até agora, as perspectivas da economia são muito ruins. Para este ano, a mediana das projeções aponta expansão de 4,93%, pouco mais que suficiente para compensar o tombo de 4,1% sofrido em 2020. A estimativa para 2022 chegou a 1%, de acordo com a Focus. Há um mês estava em 1,54%, uma projeção já muito modesta. Nos anos seguintes o avanço poderá ficar em torno de 2%.

Esses números caracterizam um desempenho miserável para uma economia dita emergente. Não há como imaginar perspectivas menos sombrias para um país desgovernado e desprovido de algo qualificável como política econômica. Sem essa política, muito mais difícil é falar de um projeto de crescimento, de modernização e de desenvolvimento econômico e social. A palavra “social”, nesta altura, pode no máximo qualificar alguma iniciativa eleitoreira do presidente da República, dependente de um calote nos precatórios e de uma farra com emendas de um Orçamento opaco.