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O custo da gestão tributária

Governo dificulta ainda mais a retomada do crescimento após a pandemia

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Por Notas & Informações
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A equipe econômica do governo do presidente Jair Bolsonaro insiste na criação de impostos de duvidosa eficácia para o funcionamento da economia, sob o pretexto de desonerar a folha de pagamento das empresas, mas pouco tem feito para modernizar o sistema de recolhimento de tributos, para torná-lo menos burocratizado e mais simples. Por isso, as empresas acabam sendo obrigadas a desviar para atividades-meio recursos que poderiam ser aplicados em suas atividades-fim, aumentando sua produtividade. Em média, elas gastam até 34 mil horas por ano só para calcular e pagar impostos e taxas, preencher as chamadas obrigações acessórias e acompanhar a fiscalização. 

O levantamento foi feito pela Deloitte, uma empresa de auditoria, com base em informações enviadas por 159 companhias de todas as regiões do País e de diversos setores, como agronegócio, alimentos, bebidas, comércio, infraestrutura, manufatura, veículos, peças e equipamentos. O estudo ouviu diversos profissionais que atuam na área contábil e fiscal dessas empresas. Os cálculos variam conforme a área de atuação de cada empresa e o número de unidades da Federação em que atua. Quanto mais está submetida a um setor muito regulado e quanto mais abrangente é seu campo de atuação no País, mais complexos são os procedimentos tributários - e, por consequência, mais funcionários a empresa necessita e mais horas de trabalho ela consome. “Uma mesma informação tem de ser reportada em obrigações acessórias diferentes. Isso faz parte da estratégia do Fisco para garantir consistência em alguns casos e facilitar a fiscalização. Mas esse excesso gera alto custo para o contribuinte, pois precisa fazer a mesma coisa várias vezes e tem mais chances de errar”, afirma Gustavo Rotta, da área de tecnologia tributária da Deloitte. 

Ao mesmo tempo que a Deloitte divulgava esse estudo, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) lançava pesquisa feita com 75 multinacionais que atuam no País e faturam entre R$ 200 milhões e R$ 10 bilhões ao ano. Além de criticar o alto custo dos procedimentos tributários, essas companhias reivindicam a melhoria das regras e a redução da burocracia para a movimentação de bens, serviços e investimentos. Pedem o alinhamento ao padrão internacional das normas brasileiras para taxações de operações internacionais, principalmente com relação às normas da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), da qual o Brasil quer fazer parte. E ainda pleiteiam mais acordos para evitar dupla tributação. Ao todo, o Brasil tem 33 acordos desse tipo, enquanto a China e a Índia têm mais de cem cada uma, segundo a CNI. 

Como após a pandemia de covid-19 a disputa por investimentos externos será acirrada, sem simplificação dos procedimentos tributários o Brasil poderá perder a concorrência para outros países, adverte a entidade. Atualmente, as companhias brasileiras gastam cerca de R$ 160 bilhões por ano com serviços de contabilidade, segundo levantamento da Roit, uma empresa de tecnologia e contabilidade. Segundo suas estimativas, se a proposta de conversão do PIS e da Cofins em Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) feita pelo governo for aprovada, durante o período de transição os gastos com gestão tributária podem ser superiores a R$ 500 bilhões - valor equivalente a cerca de 7% do PIB. 

Como, além da CBS, a equipe econômica do governo ainda quer aumentar o Imposto de Renda, mexer no Imposto sobre Produtos Industrializados e recriar a CPMF, sob a justificativa de taxar pagamentos digitais, esses números mostram o modo errático como a equipe econômica vem se comportando. Ao insistir em fazer uma reforma tributária apressada e ao mesmo tempo relegar para segundo plano a simplificação dos procedimentos tributários, ela pune duplamente as empresas. E, com isso, desestimula a captação de investimentos externos e dificulta ainda mais a retomada do crescimento após a pandemia.