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O déficit de moradias dignas

Situação habitacional no Brasil tende a piorar por causa da pandemia de covid-19

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Por Notas & Informações
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O déficit habitacional do Brasil já apresentava tendência de alta antes da pandemia e deve aumentar com ela. Segundo levantamento da Fundação João Pinheiro, entre 2016 e 2019 o déficit cresceu 4%, de 5,66 milhões para 5,88 milhões do total de 73,2 milhões de domicílios.

O déficit habitacional é composto por três indicadores: domicílios precários (improvisados ou rústicos); coabitação (unidades compartilhadas e domicílios formados por cômodos); e domicílios com custos excessivos de aluguel.

O fator que mais pesou no avanço geral é o ônus excessivo do aluguel, por causa do crescimento da população que ganha até três salários mínimos e gasta mais de 30% de sua renda com aluguel. Entre 2016 e 2019, esse número de moradias avançou de 2,8 milhões (49,7% do déficit) para mais de 3 milhões (51,7%). A habitação precária também aumentou, de cerca de 1,3 milhão para quase 1,5 milhão, respondendo por 25,2% do déficit. A coabitação responde por 23,1% do déficit, mas teve uma redução, de mais 1,5 milhão para pouco menos de 1,4 milhão de domicílios.

Norte e Nordeste enfrentam proporcionalmente as maiores mazelas. Nessas regiões, o pior problema é a habitação precária, respondendo por quase 63% do total no Brasil – 42% para o Nordeste; 21% para o Norte. Já o déficit por ônus excessivo do aluguel é um problema generalizado no Sudeste: dos 3 milhões de domicílios brasileiros nessa condição, quase metade está na região.

No período avaliado, as mulheres foram as principais responsáveis por moradias deficitárias: cerca de 62% dos responsáveis por domicílios com ônus excessivo de aluguel eram mulheres, enquanto no componente coabitação, esse índice é de 56%.

O ônus excessivo do aluguel e a evolução do número de mulheres responsáveis pelos domicílios deficitários foram destacados como as duas tendências mais marcantes nos últimos anos. “Esses dados exigem sensibilidade na elaboração de políticas e entendimento das necessidades das famílias que compõem o déficit habitacional”, afirmou, no lançamento do relatório, o secretário nacional de Habitação, Alfredo dos Santos.

O Casa Verde e Amarela, criado pelo governo Bolsonaro para substituir o Minha Casa Minha Vida, é o principal programa para combater essas carências. O programa atende as famílias mais pobres, concedendo subsídios de até 90% do valor do imóvel para famílias com renda mensal de até R$ 2 mil.

Mas o aumento do custo dos materiais de construção tem dificultado a contratação de novas casas para a população de baixa renda, de modo que o novo programa tem investido na regularização e melhoria das residências existentes.

A elaboração de mecanismos para financiar melhorias também é importante em vista da quantidade de domicílios que apresentaram alguma inadequação (de infraestrutura, edilícia ou de inadequação fundiária). “Ao contrário do déficit, a inadequação não envolve a substituição de domicílios. Aqui, a gente foca na qualidade das habitações passíveis de melhoras”, explicou o coordenador da pesquisa, Frederico Poley. Quase 25 milhões de domicílios brasileiros – um terço do total – apresentam algum tipo de inadequação.

Outro expediente – ainda em estudo, mas particularmente relevante em vista do crescimento de domicílios com ônus excessivo do aluguel – é o aluguel social, pelo qual o poder público (União, Estado ou município) banca uma parcela do aluguel das famílias pobres. 

Uma das ideias é implementar essa política por meio de parcerias público-privadas que estabeleceriam uma espécie de condomínio: o poder público pode ceder o terreno, no qual a empresa consorciada constrói residências destinadas ao aluguel social, por sua vez pago em parte pelos moradores e em parte pelo poder público. O governo estuda ainda destinar prédios já existentes para esse fim. 

Ante o impacto da pandemia, as carências de moradias devem se agravar. É fundamental que a sociedade civil e as autoridades se envolvam na revisão do Plano Nacional de Habitação que vem sendo conduzido pelo Ministério das Cidades.