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O desafio da reindustrialização

Um novo presidente poderá interromper o retrocesso e retomar a construção de um moderno e forte setor industrial

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Por Notas & Informações
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Reconstruir a indústria, retomando o caminho da modernização, será uma das grandes tarefas do próximo governo, se o novo presidente for capaz de entender as potencialidades do Brasil, de seguir uma estratégia e de repensar a inserção internacional do País. Não bastará compensar as perdas ocasionadas pela pandemia. Será preciso frear o retrocesso histórico iniciado no período petista e acelerado a partir de 2019. Depois do tombo de 2020, a produção industrial reagiu e cresceu 3,9% em 2021, mas ainda ficou 0,9% abaixo do patamar de fevereiro do ano anterior, quando apenas se percebiam os primeiros sinais do surto de covid-19. Mas o desafio real é muito mais complexo do que retornar ao nível pré-pandemia. No fim do ano, o setor industrial ainda produziu 17,7% menos que em maio de 2011, o pico da série histórica tomada como referência pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Essa diferença é muito mais que um problema conjuntural. 

Sem inovação, sem eficácia e sem poder de competição, a maior parte da indústria brasileira perdeu espaço no mercado internacional na última década. Alguns segmentos ainda tiveram sucesso e algumas empresas brilharam competindo no exterior, mas foram exceções. Houve perdas até nos mercados sul-americanos, normalmente os mais acessíveis para os produtos brasileiros. Dentro e fora do País, o quadro geral do setor manufatureiro foi de retrocesso.

A produção da indústria geral diminuiu em seis dos dez anos de 2012 a 2021, de acordo com o IBGE. Variações negativas só haviam ocorrido em um dos dez anos encerrados em 2011. Foi uma queda de 7,1% em 2009, na maior crise financeira internacional deste século. Outras diferenças importantes marcaram os dois períodos. A economia foi mais próspera no primeiro, a inflação foi mais moderada, a política monetária foi mais severa e o controle das contas públicas foi mais efetivo, embora algum afrouxamento fosse visível já em 2010.

O enfraquecimento da indústria, bem visível a partir de 2012, resultou de equívocos políticos bem conhecidos, como a estratégia de favorecimento dos chamados “campeões nacionais”, e da erosão dos fundamentos econômicos. As contas públicas se desmontaram, a política monetária se tornou ineficaz, a inflação disparou, o investimento produtivo fraquejou e o País afundou na recessão, enquanto a presidente Dilma Rousseff era submetida a um processo de impeachment, acusada de violação grave de normas fiscais.

A economia saiu da recessão, mas sua expansão nunca chegou a 2% nos primeiros três anos de retomada. A maior parte da indústria continuou sem vigor, e a administração instalada em 2019 nunca pareceu incomodada por esse fato. Mais que isso, essa administração nunca apresentou planos e metas de crescimento econômico nem programas de modernização e de ganhos de competitividade.

O Ministério da Educação logo se ajustou aos padrões intelectuais e políticos do presidente Jair Bolsonaro. Também se ajustou o Ministério de Ciência e Tecnologia, humilhado e desmoralizado por ataques presidenciais ao Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), produtor de imagens de satélite comprovadoras da devastação ambiental favorecida pela nova administração federal.

Sem compromisso com a educação, com a ciência, com a tecnologia, com a produtividade e com as condições gerais da indústria, o poder central tentou favorecer o empresariado com o barateamento da mão de obra. Esse barateamento ocorreu, de fato, mas como consequência da estagnação econômica, do desemprego e da precarização das condições de trabalho, façanhas do desgoverno instalado há pouco mais de três anos.

Iniciado há mais de um século, o esforço de industrialização acentuou-se a partir dos anos 1940 e prolongou-se por muitas décadas. Foi mantido por governos autoritários e democráticos, ideologicamente distintos, mas igualmente comprometidos, cada um à sua maneira, com ideais de modernização e de desenvolvimento. Em 2023 alguém poderá, no Palácio do Planalto, retomar essa agenda.