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O efeito econômico da epidemia

No Brasil, a iniciativa deve ficar para o Banco Central, principal fonte de estímulo a negócios

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Por Notas & Informações
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Apontado como a maior ameaça à economia mundial desde a crise de 2008, o coronavírus é um bom motivo para mais um corte de juros no Brasil, segundo economistas da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Sem espaço nas contas para maiores gastos ou corte de impostos, autoridades brasileiras só podem recorrer à política monetária para atenuar o impacto econômico da nova epidemia mundial. Mais uma vez, portanto, a iniciativa deve ficar para o Banco Central (BC), principal fonte de estímulo aos negócios num país com as finanças públicas ainda em mau estado. A recomendação do corte de juros, dirigida de forma especial a países como Brasil e Índia, está no relatório intitulado Coronavírus: a economia mundial em risco, divulgado ontem.

O crescimento global em 2020 está agora projetado em 2,4%, meio ponto abaixo da estimativa anterior, de novembro. Mas esse número aparece no cenário básico, ainda razoavelmente otimista.

Num cenário pior, com maiores danos na China e em outros países afetados pelo vírus, a expansão do produto mundial poderá ficar em 1,5%, aproximadamente metade do ritmo estimado para 2019, já qualificado como baixo pelos técnicos da OCDE.

O crescimento agora projetado para o Brasil, de 1,7%, é o mesmo apontado no relatório de novembro. A estimativa para 2021 também é igual à anterior, de 1,8%. Para a economia global a projeção é de retomada mais vigorosa, com crescimento de 3,3% no próximo ano, ou 0,3 ponto superior ao indicado em novembro.

Em países com as finanças públicas em melhores condições, a resposta aos problemas causados pela epidemia poderá ser dada por meio de ações fiscais, como expansão do investimento governamental ou corte de tributos.

A equipe da OCDE também recomenda a manutenção de políticas monetárias estimulantes, já em vigor nos países mais desenvolvidos. Nos Estados Unidos, na Europa e no Japão, os juros já são muito baixos, até negativos em alguns casos, e há muito dinheiro no mercado. Ainda assim, o presidente do BC japonês, Haruhiko Kuroda, anunciou a disposição de prover mais liquidez e garantir estabilidade no mercado financeiro se isso for necessário. Esse pronunciamento, feito um dia antes de publicado o relatório da OCDE, reforçou declaração feita na semana anterior.

Alguns grandes bancos centrais, como o da zona do euro, têm pouco espaço para ampliar os incentivos monetários. Já foram muito longe, nos últimos anos, e seus dirigentes têm conclamado os condutores da política fiscal a prover mais estímulos à economia. A conclamação tem sido feita com ênfase crescente desde o ano passado, com apoio de entidades multilaterais, como o Fundo Monetário Internacional e a OCDE.

Os entraves ao crescimento devem provir, neste ano, de fatores já discutidos nas últimas semanas, como contração do comércio, paralisação de unidades produtivas, diminuição do turismo e ruptura do fornecimento de bens intermediários e de outros insumos. Alguns desses problemas, como a interrupção de fornecimento de componentes, já são observados, por exemplo, no setor de equipamentos eletrônicos. O relatório da OCDE apontou de forma genérica uma dificuldade já sentida no Brasil.

A nova crise sanitária surgiu na China, segunda maior economia do mundo, quando terminava um ano difícil e surgiam sinais de estabilização, como a trégua no conflito comercial entre americanos e chineses. Esperava-se uma aceleração global, facilitada pela recuperação do comércio e da confiança. Agora, o melhor remédio econômico, segundo a OCDE, será, como em outras ocasiões, a ação coordenada – começando pela proteção da saúde. A resposta econômica é a segunda prioridade, e deve incluir atenção aos mais necessitados. Não há detalhes no documento, mas entre os mais vulneráveis certamente se incluem as pessoas nas filas do INSS e do Bolsa Família.