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O futuro fica para depois

Na perspectiva do País, não há nenhuma razão para otimismo ante as prioridades do governo

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Por Notas & Informações
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A informação de que o País registrou alta do PIB e da arrecadação animou os governistas, que já projetam a reeleição do presidente Jair Bolsonaro. Em suas contas, os bolsonaristas acreditam que o presidente entrará na campanha com caixa para gastar, com uma “folga” orçamentária de até R$ 40 bilhões. Consultorias estimam que a inflação, que reajusta o teto de gastos e teve grande peso no aumento da arrecadação, proporcionará uma ampliação de cerca de R$ 120 bilhões nas despesas. Ou seja, a riqueza à disposição nada mais é que um robusto saldo inflacionário.

Não se pode antecipar o que o governo pretende fazer com esses recursos, mas, a julgar pela vocação demagógica de Bolsonaro, é muito provável que o dinheiro seja investido em auxílios e em obras eleitoreiras, medidas que costumam ter impacto positivo na popularidade.

O governo há tempos prepara uma nova versão do Bolsa Família, que promete ser mais robusta que o desidratado programa de transferência de renda. O nome, obviamente, será outro, porque Bolsa Família é marca registrada do populismo lulopetista. Mas o objetivo segue sendo o mesmo: transformar eleitores em clientes, aliviando-lhes momentaneamente a aflição da fome e do desemprego com caraminguás.

Programas de transferência de renda são absolutamente necessários em um país tão pobre e desigual como o Brasil, mas devem vir acompanhados de eficientes políticas públicas de educação, saúde e emprego, que façam dos beneficiários mais do que dependentes crônicos de esmolas públicas, como acontece hoje em grande parte do País.

Ao longo do mandarinato lulopetista, o Bolsa Família, inicialmente desenhado para ser temporário, tornou-se não apenas permanente, como foi ficando cada vez mais abrangente, incluindo ano a ano mais e mais fregueses, na exata medida das necessidades eleitorais de Lula da Silva e do PT. Nada indica que a versão bolsonarista do Bolsa Família será diferente, salvo o nome.

Diante dessa perspectiva, parece claro que o governo de Jair Bolsonaro, malgrado ter sido eleito com a promessa de ser a antítese perfeita do lulopetismo, imita-o no que há de pior. Trabalha como se não houvesse futuro, e sim um permanente presente – o máximo de perspectiva é o horizonte da eleição seguinte. Só se interessa pelo atendimento de demandas imediatas por parte de grupos organizados que, de um jeito ou de outro, conseguem se fazer ouvir pelo presidente. Ora são caminhoneiros, ora são motociclistas, e Deus sabe quem mais conseguirá sensibilizar o generoso distribuidor de prebendas instalado na chefia de governo.

Na época de Lula da Silva e Dilma Rousseff, os pobres viviam a ilusão da riqueza, enquanto esta era de fato distribuída para empreiteiras amigas e empresas associadas ao Estado, no modelo de capitalismo de compadrio – tudo em nome de uma ideia de desenvolvimento que prescinde de respeito à aritmética e à ética pública.

No meio disso tudo, ontem como hoje, mesmo em momentos de recuperação econômica, o governo deixou de investir em educação, em saúde e em infraestrutura. Quando o PT estava no poder, festejava-se a abertura indiscriminada de universidades e o financiamento de faculdades caça-níqueis, enquanto o ensino básico, essencial na formação dos cidadãos, era relegado a plano secundário. Hoje, Bolsonaro transformou o Ministério da Educação em cidadela de sua cruzada ideológica em favor do atraso, além de cortar sistematicamente os recursos de pesquisa e ensino.

Gerações serão condenadas à pobreza e à mediocridade em razão dessas escolhas. Nenhuma economia se sustenta, no longo prazo, sem estudantes bem formados, sem cidadãos com acesso à saúde de qualidade, sem uma legislação tributária racional, sem respeito ao meio ambiente, sem um Estado que faz bom uso do dinheiro público e, principalmente, sem reverência aos valores democráticos.

Na perspectiva do País, não há nenhuma razão para otimismo, já que o atual presidente pleiteia a reeleição para continuar a fazer exatamente o que fez até agora: hipotecar o futuro dos brasileiros para usufruto imediato de sua família e agregados. Reformas estruturais nem pensar.