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O importante e o irrelevante

Fez bem o presidente ao desvincular-se do burburinho criado por Olavo de Carvalho

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Por Notas e Informações
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Não são poucos nem simples os desafios que o presidente Jair Bolsonaro tem pela frente. Sua energia e a de seu governo devem, portanto, ser concentradas no urgente encaminhamento das soluções para os graves problemas nacionais. É tarefa do presidente evitar que assuntos menores ou insignificantes causem desgaste desnecessário e desviem a atenção do que realmente importa para o País.

Assim, fez muito bem o presidente ao desvincular-se publicamente do burburinho criado nas redes sociais pelo escritor Olavo de Carvalho contra integrantes de seu governo. Bolsonaro viu-se obrigado a reagir particularmente a um vídeo em que Carvalho ofende os militares que assessoram a Presidência, com termos de baixo calão.

A opinião de Olavo de Carvalho sobre este ou qualquer outro assunto não deveria merecer a atenção do presidente da República, por sua natural irrelevância. No entanto, o escritor, que também é professor de um curso de filosofia online, foi adotado pela militância mais aguerrida do bolsonarismo como seu “guru”, com o apoio dos filhos do presidente, em especial o deputado Eduardo Bolsonaro e o vereador carioca Carlos Bolsonaro. Assim, tudo o que aquele escritor diz acaba sendo interpretado por esses seguidores como uma espécie de “doutrina” bolsonarista, com potencial para inspirar decisões do governo.

À influência de Olavo de Carvalho, por exemplo, atribuem-se as nomeações dos ministros da Educação – o atual, Abraham Weintraub, e o anterior, Ricardo Vélez Rodríguez – e das Relações Exteriores, Ernesto Araújo. Não por acaso, são esses os Ministérios que têm causado mais contratempos ao presidente, com disputas internas e atuação voltada exclusivamente ao combate do que Olavo de Carvalho chama de “marxismo cultural” – objetivo tão obscuro quanto irrelevante.

Já não era sem tempo, portanto, que o presidente demarcasse claramente os limites, especialmente os institucionais, que o separam daquele personagem – que, insista-se, não teria a atenção que recebe não fosse pelo fato de que os filhos e alguns ministros de Bolsonaro o têm em alta conta.

A bem da verdade, o próprio presidente já demonstrou publicamente respeito por Olavo de Carvalho, não raro de modo excessivo – como na visita aos Estados Unidos, quando Bolsonaro colocou o escritor em lugar de honra num jantar para expoentes da direita norte-americana e prestou-lhe homenagem, ao dizer que “em grande parte devemos a ele a revolução que estamos vivendo”.

Mesmo na nota em que repreende o “guru”, o presidente Bolsonaro trata de dizer, logo na abertura, que “o professor Olavo de Carvalho tem um papel considerável na exposição das ideias conservadoras que se contrapuseram à mensagem anacrônica cultuada pela esquerda e que tanto mal fez ao nosso país”. E conclui o texto declarando que tem “convicção de que o professor, pelo seu espírito patriótico, está tentando contribuir com a mudança e o futuro do Brasil”.

O presidente deve ter suas razões para demonstrar tamanha reverência por alguém que agride seus ministros e assessores com inadmissível grosseria. Também deve ter suas razões para permitir que seus canais oficiais nas redes sociais disseminem as mensagens de Olavo de Carvalho – como aconteceu com o vídeo que aborreceu os militares – e para não repreender os filhos quando estes ajudam a impulsionar essas mensagens que intoxicam o ambiente do governo.

Para o País, o que importa é que o presidente Bolsonaro foi capaz de dizer, com todas as letras, que as “recentes declarações” de Olavo de Carvalho “contra integrantes dos Poderes da República não contribuem para a unicidade de esforços e o consequente atingimento dos objetivos propostos pelo nosso projeto de governo”.

Com tal manifestação, cristalina, espera-se que o governo daqui em diante não seja mais importunado por opiniões francamente desimportantes, cuja motivação nada tem a ver com o interesse nacional – que deve ser a única e verdadeira preocupação do presidente Bolsonaro e de seus auxiliares. Há muito trabalho a fazer.