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O lobby

A experiência internacional indica que a regulamentação do lobby torna mais transparentes as relações entre agentes públicos e privados

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Por Notas e Informações
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Entre as primeiras propostas apresentadas pelo ministro da Transparência e Controladoria-Geral da União (CGU), Wagner Rosário, está a edição de um decreto regulamentando o lobby no Executivo federal. O País ainda não tem um marco legal sobre a representação de interesses e essa ausência tem dado causa a muitas confusões políticas e jurídicas, com efeitos nefastos sobre a governabilidade, as instituições políticas e a própria economia.

A regulamentação do lobby pelo governo federal pode contribuir para dar maior transparência e segurança jurídica a uma atividade que, em si, não tem por que ser proscrita ou criminalizada. A representação de interesses é uma função acessória e subsidiária na formulação das políticas públicas, na orientação das ações estatais, na atividade legislativa e nas ações administrativa e institucional do poder público.

De acordo com a CGU, o objetivo da medida é assegurar que a representação de interesses institucionais e governamentais tenha regras claras, que deem mais transparência ao processo. Atualmente em estudo pelo Ministério da Justiça, o texto estabelece pontos a respeito da divulgação dos dados, como com quem o agente público se reuniu, qual o objetivo e sobre quais temas conversaram. Também define critérios objetivos para o agendamento de audiências e a criação de uma central pública contendo informações sobre a agenda dos representantes do governo. “Estamos fazendo uma norma que traz mais transparência a essas informações e regras para a relação entre o público e privado”, disse o ministro Wagner Rosário.

Baseada na experiência de outros países, a regulamentação proposta pela CGU é enxuta, para evitar um possível engessamento da representação do setor privado junto ao setor público. Há o risco de que uma regulamentação excessivamente burocrática e complicada produza o efeito oposto ao desejado, estimulando, por exemplo, que profissionais da área atuem à margem das normas.

Ainda sujeito a revisões, o texto atual, segundo apurou o Broadcast Político, é bastante próximo da uma versão preliminar feita em 2017 pelo então ministro da Transparência, Fiscalização e Controladoria-Geral da União, Torquato Jardim. Tem-se, assim, um exemplo prático de que, mais do que com uma ruptura, o País tem a ganhar com a continuidade de trabalhos iniciados no governo anterior. O ministro Wagner Rosário disse que a proposta da CGU “está muito aderente ao que o presidente vem pregando e à necessidade de ética na administração pública”.

Um dos pontos da proposta é a proibição de que agentes públicos recebam, direta ou indiretamente, presentes de pessoas que tenham interesse na tomada de decisões do órgão. As exceções seriam os presentes de “valor módico, distribuídos em caráter geral a título de cortesia, propaganda, divulgação habitual ou por ocasião de eventos e datas comemorativas” ou “ofertados em caráter protocolar por autoridades estrangeiras”.

Seria oportuno que os estudos para a regulamentação do lobby no Executivo servissem de estímulo para o Congresso aprovar uma legislação relativa à atuação dos grupos de pressão no âmbito do Legislativo e dos órgãos e entidades da administração pública federal. Já se vão quatro décadas desde que, por iniciativa dos então deputados José Roberto Faria Lima e Marco Maciel, a matéria começou a ser discutida no Congresso. Só na Câmara dos Deputados foram apresentados cerca de 30 projetos sobre o tema, sem que nenhum tivesse sua tramitação concluída.

Não há motivo para continuar tratando o lobby como uma atividade desonesta. Nos Estados Unidos e em muitos países europeus, a representação de interesses é vista como uma ação legítima, própria da democracia. A experiência internacional indica que a regulamentação do lobby torna mais transparentes as relações entre agentes públicos e privados. Além disso, no caso brasileiro, ela pode contribuir para restabelecer um ambiente de normalidade ética e administrativa nas relações entre o setor público e o privado.