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O PIB das cidades

Estudos revelam que o Brasil está se atrofiando. Como o governo não tem projeto claro e definido para os dois anos que lhe restam, as próximas edições desses estudos poderão, infelizmente, apresentar dados ainda piores

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Por Notas & Informações
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Elaborada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), pesquisa intitulada Classificação Nacional das Atividades Econômicas (Cnae), que aferiu o Produto Interno Bruto (PIB) das cidades brasileiras em 2018, é mais um retrato dos problemas estruturais do País. 

O levantamento revela que, em quase metade dos 5.570 municípios brasileiros, o setor público continua sendo a principal atividade geradora de riqueza e emprego. A maioria dessas cidades se concentra nos Estados do Acre, Roraima e Amapá, situados na Região Norte, a menos desenvolvida do País; no Piauí e na Paraíba, na Região Nordeste; e no entorno do Distrito Federal, na Região Centro-Oeste.

Segundo a pesquisa, ¼ do PIB brasileiro de 2018 veio de apenas oito municípios – São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília, Belo Horizonte, Manaus, Curitiba, Porto Alegre e Osasco. Só a cidade de São Paulo foi responsável por 10,2% do PIB do País, naquele ano. Além disso, em todo o Estado de São Paulo apenas 9,6% dos municípios apresentaram dependência do setor público, como gerador de riqueza e emprego. Já no Acre, Roraima, Amapá e Piauí, o índice foi superior a 90%.

Em termos absolutos, 2.739 cidades de todas as regiões do País estavam nessa situação em 2018. Quando o estudo do IBGE exclui a administração pública da análise, o setor de serviços é o principal gerador de riqueza e de emprego em 3.832 municípios, dos quais se destaca São Paulo. A cidade concentrou 29,6% das atividades de setor em todo o País, em 2018. Em seguida vem a agricultura, da qual dependem 862 municípios situados nas Regiões Sul e Centro-Oeste, onde se concentra a produção de soja, algodão e arroz. O levantamento mostrou ainda que os 71 municípios que alcançaram os maiores PIBs, cuja soma equivale a metade do PIB total do País, concentram pouco mais de 1/3 da população brasileira, estimada em 211 milhões de habitantes. Na outra ponta, as 1.346 cidades que registram os menores PIBs, cuja soma equivale a apenas 1% do PIB total, concentram 3,1% da população. 

Já na análise da distribuição do PIB por concentrações urbanas, que envolvem cidades com mais de 100 mil habitantes e alto grau de crescimento geográfico e conurbação, o estudo do IBGE detectou que ¼ da produção econômica do País se concentrava nas regiões metropolitanas de São Paulo e do Rio de Janeiro. A pesquisa também aponta que as 10 maiores concentrações urbanas, que estão situadas em Belo Horizonte, Porto Alegre, Brasília, Curitiba, Campinas, Salvador, Recife e Fortaleza, além de São Paulo e Rio de Janeiro, foram responsáveis por quase metade do PIB brasileiro de 2018. 

A desigualdade fica ainda mais inequívoca quando o estudo do IBGE compra o Semiárido, a Amazônia Legal e o que chama de cidade-região São Paulo. Enquanto o Semiárido e a Amazônia Legal representaram apenas 5,2% e 8,8% do PIB total de 2018, respectivamente, a cidade-região de São Paulo foi responsável por 24%. 

Quando os técnicos do IBGE levam em conta séries mais longas de dados, fica evidente que a desconcentração da riqueza e a redução da dependência que as cidades pobres têm do setor público vêm ocorrendo num ritmo excessivamente vagaroso. Essa é uma má notícia, principalmente se for lida juntamente com os números de dois outros importantes levantamentos divulgados recentemente. Segundo estudo do Fundo Monetário Internacional, há 40 anos que a economia do Brasil cresce abaixo do ritmo mundial. E, como falta de crescimento tem forte impacto em matéria de desemprego e pobreza, corroendo as condições de vida da população, o último Índice de Desenvolvimento Humano, que é elaborado pela ONU, mostrou que o Brasil caiu da 79.ª para a 84.ª posição, entre 2018 e 2019. O que todos esses estudos revelam, em suma, é que o Brasil não se encontra só estagnado – mais do que isso, ele está se atrofiando. E como o governo não tem um projeto claro e definido para os dois anos de mandato que lhe restam, as próximas edições desses estudos poderão, infelizmente, apresentar dados ainda piores.