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O uso eleitoreiro do Bolsa Família

A assistência estatal aos mais pobres não pode se transformar em sistema de compra de votos

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Por Notas & Informações
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Nas administrações petistas, foi um escândalo recorrente o uso eleitoreiro do Bolsa Família. Em vez de ajudar a população mais carente, mais parecia que o objetivo do programa social era ajudar o partido do sr. Luiz Inácio Lula da Silva a se manter no poder.

A tática era descarada. Nas campanhas eleitorais, o PT anunciava que, caso o eleitor não votasse no partido do sr. Luiz Inácio Lula da Silva, ele iria perder os benefícios oriundos do programa social. Na campanha de 2014, por exemplo, mesmo com os candidatos de oposição afirmando que manteriam o Bolsa Família, a presidente Dilma Rousseff, então candidata à reeleição, insistia que o programa social “vai acabar se eles forem eleitos”.

O reiterado uso eleitoreiro do Bolsa Família foi uma das causas para o antipetismo nas eleições de 2018 e de 2020. Afinal, a manipulação do programa social para fins eleitorais era sintoma de uma manobra das mais perversas: a manipulação da pobreza para fins eleitorais.

Ao longo dos anos, a dimensão manipuladora ficou em especial evidência diante do descaso do PT em prover portas de saída para o Bolsa Família. Em vez de fomentar a autonomia, o programa sob a gestão petista parecia destinado a perpetuar a dependência da ajuda estatal.

Diante dessa lamentável situação, era de esperar que uma das prioridades do presidente Jair Bolsonaro – eleito para “impedir a volta do PT” – fosse transformar o Bolsa Família em verdadeira política de Estado, protegendo-o de manobras eleitoreiras. Num regime democrático, não cabe transformar a necessária assistência estatal aos mais pobres em sistema de compra de votos.

No entanto, desde o seu início, o governo Bolsonaro tem-se mostrado alheio a qualquer preocupação de aperfeiçoar o Bolsa Família. Por exemplo, no fim de 2019 e ao longo de 2020, a Câmara dos Deputados trouxe à discussão algumas propostas para a reformulação do programa social. O Executivo federal, no entanto, colocou-se à margem do debate, numa inexplicável indiferença a tema tão relevante.

Como se não bastasse sua omissão na melhoria do Bolsa Família, o presidente Jair Bolsonaro tem revelado que pretende percorrer o mesmo caminho do sr. Luiz Inácio Lula da Silva, reforçando o uso eleitoreiro do programa. No mês passado, por exemplo, Jair Bolsonaro anunciou que pretende aumentar no segundo semestre o valor médio do benefício do Bolsa Família, de R$ 192 para R$ 250.

A promessa de aumento, desacompanhada de qualquer estudo e apresentada como gesto de boa vontade do presidente da República, é mais um sintoma de que o presidente Jair Bolsonaro vê no Bolsa Família um instrumento para angariar apoio político. Em vez de promover cidadania, o programa social é meio de instrumentalização dos pobres.

A confirmar o uso eleitoreiro do Bolsa Família, o presidente Jair Bolsonaro anunciou mais uma medida de vinculação do programa à sua pessoa, excluindo as prefeituras do cadastramento. “Está quase pronta também a questão do novo Bolsa Família”, disse Jair Bolsonaro em Maceió. “A inclusão no Bolsa Família não será mais procurando prefeituras pelo Brasil, será feita através de um aplicativo.”

A exclusão das prefeituras revela também desconhecimento sobre o funcionamento do programa. Mais próxima do cidadão, a esfera municipal é essencial para a análise da situação de cada família. Além disso, o aplicativo é inacessível a muitas pessoas em situação de pobreza, as que mais precisam do Bolsa Família.

O anúncio desse novo Bolsa Família ratifica o caráter anticidadão do governo Bolsonaro. A rigor, não é uma novidade. Foi o mesmo governo que, no meio da pandemia, se valeu do auxílio emergencial para promover a bancarização forçada da população, vinculando o recebimento do benefício à conta na Caixa Econômica.

Lula e Bolsonaro revelam-se cada vez mais semelhantes. Para eles, o povo é mero meio de obtenção e manutenção do poder. Assim, quanto mais a população for vulnerável e dependente, melhor para eles. O caminho da cidadania é muito diferente. Nele não há cabresto.