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O verdadeiro problema do lixo

Muito maior atenção deve ser dada ao que é feito com o lixo jogado de maneira irregular

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Por Notas & Informações
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São Paulo avançou mais um pouco na luta para coibir o uso de materiais plásticos descartáveis, com a sanção pelo prefeito Bruno Covas de lei que proíbe estabelecimentos comerciais de fornecer esse tipo de produto. O primeiro passo nesse sentido foi a lei que proibiu os canudinhos de plástico, aprovada no ano passado. Infelizmente, essa ofensiva não é seguida por uma eficiente reciclagem do lixo descartável coletado e muito menos por um rigoroso combate ao descarte irregular do lixo em geral.

Bares, restaurantes e bufês terão um ano para se adaptar à nova lei e banir copos, pratos e talheres de plástico, sob pena de serem punidos com multas de até R$ 8 mil ou mesmo de fechamento do estabelecimento. Também serão alvos da Prefeitura empresas que organizam festas infantis, clubes noturnos e espaços para eventos culturais e esportivos. Esses estabelecimentos deverão substituir os produtos de plástico por outros feitos com material biodegradável. O objetivo da lei é “permitir a reciclagem”.

Há, porém, um importante obstáculo para que essas boas intenções se tornem realidade. São as notórias deficiências do serviço de fiscalização. Se ela não for capaz de apontar as falhas e aplicar as multas aos faltosos, essa lei, assim como a dos canudinhos, será de difícil aplicação. Há muito tempo a Prefeitura não investe tanto quanto devia para aumentar o número de fiscais, insuficiente para cuidar de uma cidade gigantesca como São Paulo, e melhorar seu treinamento. Se esse obstáculo for superado, será preciso cuidar de um outro aspecto do problema dos materiais plásticos que degradam a natureza. Esses materiais são muito mais numerosos do que os que foram objeto dessas duas leis.

O resultado da coleta seletiva que separa o lixo degradável do reciclável (do qual o plástico é um dos principais itens) tem sido decepcionante. Estima-se que em 2018 foram recolhidas cerca de 77 mil toneladas de lixo reciclável em São Paulo, das quais apenas 7% foram recicladas. É preciso considerar, primeiro, que essa quantidade de lixo recolhida fica claramente abaixo do que deveria, apesar da colaboração da população. Não se pode esquecer que o Brasil – e o Estado de São Paulo em posição de destaque – é o quarto maior produtor de lixo plástico do mundo, segundo estudo do Fundo Mundial para a Natureza (WWF) – com 11 milhões de toneladas –, atrás de Estados Unidos, Índia e China. A baixa porcentagem de reciclagem se explica porque o lixo não chega como deveria às usinas de reciclagem, ou porque nem todas conseguem tratar o material.

O fraco desempenho de São Paulo na reciclagem (7%) fica ainda mais evidente quando comparado aos índices de países europeus: Alemanha 61,8%, Bélgica 57,6% e Suíça 50,5%, para citar apenas alguns exemplos. Mesmo considerando que não se pode exigir da capital paulista um desempenho semelhante ao de países ricos como esses, a distância que a separa deles é grande demais.

O problema do lixo em São Paulo não deve ser analisado apenas do ponto de vista dos materiais recicláveis. Considerando a totalidade do lixo, a parte reciclável chega a ser um aspecto menor. É preciso, sim, cuidar de canudinhos, copos, pratos e talheres de plástico, mas muito maior atenção tem de ser dada ao que é feito com o lixo em geral, jogado irresponsavelmente em centenas e centenas de pontos de descarte irregular, todos muito bem conhecidos, sem que as autoridades municipais tomem as providências que se impõem para pôr fim a essa situação.

Lixo de todo o tipo é jogado em ruas, calçadas, praças, terrenos baldios, córregos e rios: entulho, restos de comida, embalagens de água mineral e refrigerantes e até aparelhos eletrodomésticos e móveis. Tornou-se comum a cena de sofás flutuando nas águas dos Rios Tietê e Pinheiros, quando há enchentes. São Paulo se transformou numa cidade suja. Por culpa também de parte da população, que precisa ser multada por seu comportamento antissocial.