Conseguir apoio parlamentar será apenas uma das condições de sucesso do presidente Jair Bolsonaro. Além de se entender com os congressistas, ele terá também de governar de olho no mercado - e o mercado, em contrapartida, poderá ajudá-lo a encontrar o caminho. Quase um sonho para o governo, juros baixos até o fim do ano estão nas projeções do setor financeiro e das principais consultorias, mas essas projeções dependem de alguns dados e de alguns pressupostos muito importantes. A taxa básica de juros, a Selic, poderá permanecer em 6,50% até o começo de 2020 se a inflação continuar contida, se a política monetária americana for tão suave quanto indica o banco central dos Estados Unidos e se o governo brasileiro avançar no ajuste de suas contas e na implantação da reforma da Previdência. Pela primeira vez o mercado acaba de estender até o início do próximo ano a taxa básica hoje em vigor. A mediana das estimativas passou de 7% para 6,50% na última pesquisa Focus, divulgada nesta segunda-feira pelo Banco Central.
A pesquisa é publicada só com os números, mas as condições implícitas são conhecidas de quem acompanha as avaliações do mercado e, além disso, são discutidas no dia a dia por especialistas. Juros moderados combinam com preços bem comportados. A inflação estimada para o ano caiu de 4% para 3,94%. Não se esperam fortes pressões inflacionárias com a economia em crescimento ainda modesto, mas a aposta pode mudar, nos próximos meses, se o governo descuidar da pauta de ajustes e reformas ou se tropeçar de forma desastrada na execução de sua estratégia econômica.
Do lado externo, a política de juros do Federal Reserve (Fed, o banco central americano) terá um peso considerável. Se essa política for moderada, como se espera, produzirá pouca ou nenhuma pressão sobre os mercados de câmbio. O dólar previsto para o fim deste ano passou de R$ 3,75 para R$ 3,70 na pesquisa Focus. Se isso se confirmar, o câmbio deixará de ser um fator inflacionário relevante em 2019. Mas o preço do dólar depende também de fatores internos, e um dos mais importantes é a confiança na política econômica.
Se essa política for mal formulada ou mal conduzida, poderá afetar o câmbio mesmo num cenário de calmaria internacional e a cúpula do governo brasileiro terá de considerar também esse dado. O preço do dólar é um dos mais importantes para a economia. Um de seus efeitos, no caso de valorização excessiva em relação ao real, é o aumento de vários preços, com perda para as famílias e complicações para vários tipos de negócio.
A perspectiva de inflação contida, juros moderados e câmbio confortável está associada também a um pressuposto pouco animador. Até 2022, último ano de mandato do atual governo, a economia brasileira crescerá mais que em 2018, mas com um mínimo de dinamismo. Para todo o período está projetada a taxa anual de 2,50%, inferior à da maioria dos países emergentes e também à média esperada para os países da América Latina.
Também esse número contém uma importante mensagem para o governo. O Brasil, segundo as estimativas correntes, só escapará desse desempenho medíocre se algo for feito - se possível a partir deste ano - para elevar sua capacidade produtiva e seu potencial de crescimento econômico.
O governo pouco tem informado sobre isso. Faltam ainda informações claras sobre como se cuidará da ampliação e da modernização da infraestrutura e do fortalecimento das empresas privadas. Faltam informações, também, sobre objetivos estratégicos e até sobre a identificação de gargalos.
Com ajustes e com a reforma da Previdência, o governo poderá manter baixa a inflação e obter superávit primário a partir de 2022, segundo a pesquisa Focus. Haverá vitórias importantes e um desastre será evitado, mas será preciso mais que isso para dinamizar a economia. Esse contraste é uma das principais mensagens embutidas na pesquisa. O presidente Bolsonaro deveria considerá-la seriamente.