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Os desordeiros e seu líder

Bloqueios de estradas são resultado direto do comportamento de Jair Bolsonaro

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Por Notas & Informações
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Queira ou não Jair Bolsonaro, a Presidência da República tem enorme peso sobre o País. Quando o chefe do Executivo federal afronta os outros Poderes e flerta com a ideia de ruptura da ordem democrática, o problema já não é apenas institucional. A aposta no conflito produz consequências sobre toda a ordem social. As paralisações e bloqueios promovidos por caminhoneiros – no dia 8 de setembro, foram registrados distúrbios em ao menos 13 Estados – são resultado direto do comportamento de Jair Bolsonaro.

Destaca-se, em primeiro lugar, a contradição entre a realidade do governo Bolsonaro e suas promessas. O discurso bolsonarista, especialmente quando expressa saudosismo da ditadura militar, remete à ideia de ordem pública. Conforme esse discurso, depois de anos de confusões e balbúrdias criadas pela esquerda e seus movimentos sociais, Jair Bolsonaro viria impor o estrito cumprimento da lei e a mais rigorosa ordem no País. Não é o que se vê.

Os bloqueios das estradas começaram justamente no 7 de Setembro, data escolhida pelo bolsonarismo para afrontar o Supremo Tribunal Federal (STF). E não se trata de coincidência. A pauta dos caminhoneiros é a mesma pauta de Jair Bolsonaro.

Em um vídeo que circula nas redes sociais, Francisco Burgardt, um dos líderes do movimento Caminhoneiros Patriotas, prometeu entregar ao presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, um documento exigindo a destituição de ministros do STF. “O povo não aguenta mais esse momento que o País está atravessando através da forma impositiva que o STF vem se posicionando. O povo está aqui (na Esplanada dos Ministérios) buscando solução e só vamos sair com solução na mão”, disse Francisco Burgardt. A fala de Chicão Caminhoneiro, como é conhecido, reflete fidedignamente o que o presidente Bolsonaro diz todos os dias.

Foi constrangedora a reação de Jair Bolsonaro aos bloqueios das estradas, revelando uma vez mais sua incapacidade de se portar em conformidade com o cargo que ocupa. O presidente enviou um áudio, em tom de súplica, aos caminhoneiros. “Dá um toque nos caras aí para liberar”, disse Jair Bolsonaro. O ministro da Infraestrutura, Tarcísio de Freitas, confirmou a autenticidade da gravação.

Incapaz de exercer a autoridade que lhe compete na defesa da lei e da ordem, o presidente Bolsonaro trata os desordeiros como companheiros e aliados políticos. “Deixa com a gente em Brasília. Não é fácil negociar com outras autoridades, mas vamos fazer nossa parte. Vamos buscar uma solução para isso”, disse Bolsonaro no áudio.

A súplica do presidente não parece ter sido muito convincente. Há quem continue achando que o apoio a Jair Bolsonaro significa paralisar o País. “Vamos trancar todo o Brasil porque estamos do lado do senhor (presidente Bolsonaro)”, disse o caminhoneiro Marcos Antônio Pereira Gomes, conhecido como Zé Trovão, em vídeo divulgado nas redes sociais.

Trata-se de uma situação absolutamente disfuncional, mas que, a rigor, é a mais natural consequência do bolsonarismo. Ante um presidente da República que sai às ruas no 7 de Setembro para afrontar o Supremo e dizer que não cumprirá determinadas ordens judiciais, seria de estranhar que seus aliados políticos manifestassem alguma razoabilidade ou civilidade.

No dia 27 de agosto, o presidente Bolsonaro recomendou que a população comprasse fuzil. “Tem que todo mundo comprar fuzil, pô. Povo armado jamais será escravizado”, falou Bolsonaro, em frente ao Palácio da Alvorada. Perante essa recomendação, deve-se admitir que a insistência de Zé Trovão no bloqueio das estradas não está desalinhada com o bolsonarismo e seu líder. “Tem gente ligando aí, mandando desmobilizar as paralisações, mas não vamos aceitar. Fecha tudo”, pediu Zé Trovão.

Desde que assumiu a Presidência da República, Jair Bolsonaro dedica-se a criar conflitos, proferir ameaças e destruir possíveis pontes e canais de diálogo. Não é de estranhar, portanto, que seus aliados bloqueiem estradas, como tática para impor reivindicações. Eis o bolsonarismo e suas consequências.