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Os eleitores não estão alheios

Não se pode medir o impacto do populismo desbragado que se avizinha. Mas pesquisa revela que o descalabro do governo não passa despercebido

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Por Notas & Informações
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A pesquisa Ipec divulgada no dia 14 passado revela de maneira inequívoca que a maioria dos eleitores reprova o governo de Jair Bolsonaro e não confia no presidente da República. É cedo para avaliar o impacto que isso terá na campanha de Bolsonaro pela reeleição, pois, afinal, não se deve subestimar a força da caneta presidencial. Bolsonaro já deu mostras de que fará o que pode e o que não pode em 2022 para não entregar o cargo a um eventual sucessor. Decerto lançará mão de medidas populistas que podem, em maior ou menor grau, reverter a má avaliação do governo e a rejeição a seu nome. De qualquer forma, os números revelados pelo Ipec não são nada confortáveis para um incumbente em último ano de mandato que tem pela frente uma eleição marcadamente plebiscitária.

Para 55% dos entrevistados pelo Ipec entre os dias 9 e 13 deste mês, o governo Bolsonaro é “ruim ou péssimo”. O resultado é 2 pontos porcentuais maior do que o apurado na pesquisa anterior, em setembro. O governo é “ótimo ou bom” para apenas 19% dos entrevistados. Há três meses, 22% dos eleitores avaliavam o governo de forma positiva. Já para 25% das pessoas ouvidas pelo Ipec o governo é “regular” (eram 23% em setembro).

O Ipec também aferiu a avaliação da forma de Bolsonaro governar. Quando questionados a respeito da “maneira como o presidente Jair Bolsonaro está governando o Brasil”, 68% disseram desaprovar, mesmo resultado aferido na pesquisa anterior. Já 27% responderam que aprovam a atuação do presidente, uma queda de 1 ponto porcentual em relação à pesquisa realizada em setembro, dentro da margem de erro. Outros 4% não souberam ou não quiseram responder.

O dado da pesquisa que talvez mais preocupe Bolsonaro diz respeito à confiança da sociedade no presidente. A confiança é um atributo essencial para alguém que ocupa o mais elevado cargo do Poder Executivo federal. Pois nada menos do que 70% dos entrevistados pelo Ipec afirmaram que Bolsonaro não é uma pessoa confiável, um aumento de 1 ponto porcentual em relação à avaliação anterior. Outros 27% disseram confiar no presidente (eram 28% em setembro) e 3% não souberam ou não quiseram responder (o mesmo porcentual verificado há três meses).

A rigor, todos esses números tabulados pelo Ipec refletem a percepção da maioria da sociedade de que não há governo no País. Os achados da pesquisa evidenciam que os cidadãos não estão alheios à total paralisia do governo federal diante de problemas muito sérios, que afligem milhões de brasileiros, e que seguem intratados enquanto Bolsonaro se mantém ocupadíssimo em “motociatas”, praias e beiras de estrada cuidando de seus próprios interesses.

Não escapou aos olhos da maioria dos entrevistados pelo Ipec a total ausência de políticas públicas bem formuladas para enfrentar uma crise sanitária sem precedentes, que já custou a vida de mais de 617 mil brasileiros. A maioria dos eleitores também demonstrou não estar insensível à profunda crise econômica e social que aflige a população hoje e projeta um ano novo ainda mais sombrio, com inflação, juros altos, desemprego e fome. A reprovação da maneira de Bolsonaro governar, por sua vez, também sugere que práticas espúrias como a compra de uma base de apoio congressual por meio de “orçamento secreto” e, principalmente, o negacionismo tacanho do presidente no combate à pandemia de covid-19, desvirtuando a ideia de “liberdade” e agindo contra o interesse nacional, não contam com o apoio da maioria dos eleitores.

O que resta evidente a partir dos dados dessa nova rodada da pesquisa Ipec é que a maior parte dos brasileiros não está satisfeita com os rumos do País sob o comando de Jair Bolsonaro. Ao afirmarem que não confiam no presidente da República, demonstram também não nutrir esperanças, ao menos não por ora, de que Bolsonaro seja a pessoa certa para resolver os graves problemas que os afligem. Evidentemente, como já foi dito, o quadro apresentado hoje pode não ser o mesmo à época da próxima eleição. Os reflexos do populismo desbragado que se avizinha ainda serão medidos. Mas uma coisa é certa: os brasileiros estão atentos ao descalabro.