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Os problemas de sempre

Enem de 2021 também será comprometido pela inépcia administrativa do governo

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Por Notas & Informações
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Se ainda havia dúvidas com relação à incapacidade do governo Bolsonaro de promover o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) sem problemas de planejamento, elas foram desfeitas com a demissão do chefe da Diretoria de Avaliação da Educação Básica do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep), Alexandre Silva. 

A Diretoria de Avaliação é responsável pela organização do Enem. O diretor demitido, um coronel-aviador sem experiência em ensino e que estava no cargo havia menos de três meses, foi substituído temporariamente por Anderson Oliveira, um bacharel em direito que tem mestrado em gestão pública e pós-graduação em coaching religioso. Se for efetivado, será a sétima pessoa a ocupar essa diretoria desde o início do governo Bolsonaro. A sucessiva troca de dirigentes na área educacional tem sido a marca de sua gestão. Ao longo destes dois anos e cinco meses, o Ministério da Educação (MEC) está em seu quarto ministro. Já o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais, que é o braço operacional do MEC, está em seu quinto presidente. 

Por isso, falta entrosamento entre as equipes técnicas dos dois órgãos. As divergências entre elas cresceram a tal ponto que, há um mês, sete ex-ministros da Educação divulgaram uma carta acusando o MEC de vir tentando afastar o Inep das discussões sobre avaliação educacional e afirmando que “o enfraquecimento deste órgão colocará em risco políticas públicas cruciais” para gestores escolares e professores. A confusão é tanta que a edição do Enem deste ano corre o risco de ser realizada só em janeiro de 2022. Em média, são necessários 170 dias entre o fim das inscrições e a realização do exame para que todo o processo de elaboração, distribuição e logística do Enem seja cumprido. Mas, até agora, só foi publicado um edital sobre isenção da taxa de inscrição. 

Desde que o Enem foi criado, em 1998, seu calendário é definido no início de cada ano. Os editais costumam ser lançados em março. As inscrições são abertas em maio. E as provas são realizadas em outubro ou novembro. Contudo, a edição de 2020, que estava prevista para novembro, só foi realizada em 2021. Apesar de o adiamento ter sido provocado pela crise sanitária, as provas foram prejudicadas por falhas de planejamento e erros logísticos cometidos pelas autoridades educacionais, o que levou o Ministério Público Federal a pedir a abertura de investigações. 

Como o Enem é a principal porta de entrada para o ensino superior, esse adiamento prejudicou a programação acadêmica das universidades federais. Entre outros motivos, porque elas precisaram de tempo para processar a matrícula dos estudantes selecionados. Por isso, o início das aulas nessas universidades em 2021, que estava programado para o fim de fevereiro, só começou entre a última semana de abril e a primeira semana de maio. 

Além do problema das trocas de seus dirigentes, o Inep informou em caráter não oficial ao Conselho Nacional de Educação (CNE) que vem enfrentando problemas orçamentários e nem sequer definiu data para realizar a próxima edição do Enem. Desse modo, as universidades federais quase certamente terão de passar, em 2022, pelas mesmas dificuldades que tiveram neste ano. 

Para promover o Enem, o Inep prevê gastos no total de R$ 794 milhões, mas parte de seu orçamento se encontra bloqueada pelo Ministério da Economia. Mesmo que esses recursos venham a ser desbloqueados, a diretoria encarregada da organização do Enem ainda tem de definir os locais das provas, estabelecer os prazos para correção e liberação das notas e preparar medidas sanitárias para garantir a segurança dos estudantes, o que leva tempo.

Mecanismos de avaliação escolar são decisivos para a reformulação de sistemas de ensino, principalmente quando mal orientados. Ao se revelar mais uma vez despreparado para aplicar o Enem, o governo Bolsonaro deixa claro que não tem o menor compromisso com a educação, e não se preocupa com a formação das novas gerações.