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Pelo menos a inflação alivia

As condições de emprego continuam ruins, mas a inflação joga a favor dos brasileiros

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Por Notas & Informações
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om os preços da comida bem comportados, pelo menos a inflação continua jogando a favor dos brasileiros, enquanto a economia se move muito devagar e as condições de emprego permanecem muito ruins. A melhora no cenário dos supermercados, feiras e em boa parte do varejo também facilita a vida do governo, ainda amarrado pela falta de dinheiro e assombrado por uma dívida enorme e crescente. Os preços são uma preocupação a menos para a equipe econômica. Além disso, a dívida pública ficará mais barata e mais administrável se os juros voltarem a cair. Com inflação de 0,11% em agosto, 2,54% no ano, 3,43% em 12 meses e sem grandes pressões visíveis no radar, parecem consolidar-se as condições para um novo corte dos juros básicos pelo Banco Central (BC). Os números foram informados na sexta-feira pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

O desemprego ainda muito alto, com 12,6 milhões em busca de trabalho no trimestre encerrado em julho, é mais um argumento a favor de nova redução do custo do dinheiro. Os membros do Copom, o Comitê de Política Monetária do BC, terão de pesar esses dados, é claro, contra riscos internos e externos, quando se reunirem para as próximas decisões, nos dias 17 e 18 deste mês. Por enquanto, o cenário parece continuar favorável à ampliação dos estímulos, com novo corte da taxa básica, a Selic, atualmente em 6%. Pela avaliação dominante no mercado haverá mais dois cortes da taxa básica até o fim do ano, um em setembro, outro provavelmente na reunião dos dias 29 e 30 de outubro. A mediana das projeções aponta uma taxa de 5% no fim do ano. A estimativa para o fim de 2020 está em 5,25%. Esse cálculo pressupõe uma inflação de 3,85%, pouco mais alta que a projetada para este ano (3,59%), associada a uma atividade econômica mais intensa. Não só o grupo Alimentação e Bebidas, com queda de 0,35% no mês, apresentou baixa de preços em agosto. Houve deflação em três dos nove grupos de bens e serviços oferecidos aos consumidores. Também houve taxas negativas em Transportes (-0,39%) e em Saúde e Cuidados Pessoais (-0,03%). A maior alta, como já se havia notado em apuração anterior, ocorreu no item Habitação (+1,19%), por causa da alta de 3,85% nas contas de eletricidade. Gás encanado e água e esgoto também pressionaram os orçamentos familiares em algumas cidades, afetando a evolução geral do índice. Esses detalhes são especialmente importantes porque confirmam uma inflação puxada principalmente por preços monitorados ou administrados, com variação independente das decisões dos consumidores. Os preços formados pela interação das forças de mercado permanecem com evolução moderada, porque as famílias continuam muito cautelosas. A boa oferta de alguns bens essenciais, como alimentos, e as expectativas de inflação moderada explicam em parte a evolução dos índices de preços ao consumidor. Isso vale para os indicadores do IBGE e para aqueles elaborados por outras entidades públicas e privadas. Mas a calmaria dos preços – e até a deflação em alguns setores – decorre também da baixa demanda. A procura deprimida é obviamente vinculada ao desemprego, à perda de renda de milhões de famílias e à insegurança quanto às perspectivas da economia e das oportunidades de trabalho. As projeções de inflação contidas nos próximos anos também são claramente ligadas à expectativa de crescimento de 2,10% em 2020 e 2,50% em cada um dos dois anos seguintes. Esse vínculo está embutido nas expectativas do mercado. A recuperação será modesta, mesmo com a reforma da Previdência, se faltarem políticas de aumento do potencial produtivo do Brasil. A curto prazo a expectativa continua sendo de baixa atividade, por falta de estímulos significativos. Alguns podem estranhar uma inflação tão moderada num ano com fortes altas do dólar, moeda importante na formação de preços. Não há mistério. Com a demanda retraída, os canais de transmissão de aumentos ficam em parte bloqueados. O desemprego freia até a influência do dólar.